Pesquisador do Grupo de Pesquisa sobre “Transformação ecológica e diversificação energética” da Fundação Maurício Grabois, Allan Kardec defende a exploração do petróleo na chamada “Margem Equatorial Brasileira”.
A Amazônia está no centro da atenção internacional sobre a exploração de petróleo offshore.
Já prevendo esse debate, e com a experiência de ter servido como diretor da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), um grupo de pesquisadores nos juntamos para formar a maior rede de especialistas sobre a Margem Equatorial Brasileira (MEQ), composta por pesquisadores de 13 universidades brasileiras, entre instituições locais e outras com grande tradição e conhecimento sobre a MEQ – chamada Rede Amazônia Azul (RAZUL).
Da mesma forma, em 2006, um grupo de 100 professores criamos a Rede Nordeste de Biotecnologia (RENORBIO), onde já tivemos 1379 teses de doutorado defendidas com 546 alunos atualmente matriculados.
Ela visa consolidar os conhecimentos locais – como a fauna e a flora do Nordeste brasileiro, conhecimentos tais como os benefícios farmacológicos de plantas como da erva cidreira, da amendoeira ou as vantagens do peixe tilápia e os direitos das populações originárias, indígenas e quilombolas em preservarem seu patrimônio ancestral.
Similarmente, a RAZUL servirá para estudar a MEQ de forma metódica e científica.
A Rede é formada por pesquisadores do Brasil inteiro, com décadas de experiência na MEQ, onde vários moram no Norte ou Nordeste do Brasil – essa foi uma condição para a formação da rede, isto é, de ter vozes que repercutissem as demandas e exarassem os conhecimentos locais, em que, por exemplo, os amazônidas estudassem e pesquisassem sobre a Amazônia.
Dessa forma, juntamos o conhecimento histórico agregado aos saberes, tais como sobre as populações indígenas, agrupamentos quilombolas, comunidades ribeirinhas, além de contar com aqueles que estudam profundamente a antropologia do nosso povo assim como as formações geológicas dessa área, além das correntes oceânicas. Esse grupo de cientistas é multidisciplinar, representando campos como geologia, economia, ciências sociais, oceanografia, antropologia, tecnologia e engenharia.
A RAZUL é formada por professores pesquisadores de alto nível, em áreas como oceanografia, meio ambiente, geopolítica e petróleo. Com uma diferença. Ela nasceu como um movimento da comunidade científica preocupada com o desenvolvimento nacional.
Temos muitas contribuições. Em nossa primeira ação, fizemos uma nota técnica com Pedro Zalan, um dos maiores geólogos do Brasil e Ronaldo Carmona, da Escola Superior de Guerra. Mostramos que há possibilidades de haver entre 20 a 30 bilhões de barris de petróleo só na Bacia Pará Maranhão (PAMA)!
O professor Duque Dutra, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e Carmona mostraram em outra nota técnica que o aproveitamento de um campo petrolífero na PAMA que contenha 400 milhões de barris, ao longo das próximas três décadas, poderia gerar R$ 14 bilhões de renda. Ou seja, um incremento de 12 % do PIB do Pará, ou 20% do Maranhão em valores de hoje.
Há uma mobilização nacional e diálogo da Rede com diferentes setores da sociedade. Conversamos com a Diretoria Colegiada da ANP e a Agência Espacial Brasileira; com ministros e dirigentes do Ministério das Minas e Energia, da Defesa, da Ciência e Tecnologia; com a indústria, entre elas FIEMA, FIEPA, ABEGAS, EnerGeo Alliance ou empresas como TGS, ExxonMobil e Petrobras! O nome, inclusive, “Amazônia Azul” é inspirado – e permitido – pela Marinha do Brasil.
Adicionalmente, gostaríamos de apontar alguns aspectos que ilustram o debate atual, no que segue.
Nossos pesquisadores entendem que não há conhecimento consolidado o suficiente para afirmar a existência do “Great Amazon Reef System”, formado por corais.
Corais são pequenos animais marinhos que vivem em colônias e frequentemente têm esqueletos rígidos. Por outro lado, as algas calcárias têm carbonato de cálcio, um mineral que compõe o calcário, em suas paredes celulares, sendo descritas como “algas que se tornaram pedra”. Simplificadamente, a borda da plataforma continental representa a “fronteira” entre as águas rasas do oceano próximo à costa e suas partes mais profundas.
Na região da borda da plataforma da bacia da Foz do Amazonas, predominam algas calcárias, na maioria das vezes mortas, cujo desenvolvimento máximo ocorreu entre 17 e 11 mil anos atrás, quando o nível do mar estava de 100 a 120 metros abaixo do atual, durante a Última Era do Gelo.
Ao lado das mudanças climáticas, nossa Rede acha fundamental considerar a desigualdade de renda – que afeta a região de maneira implacável, como componente fundamental de estudo e de decisão dos países da Amazônia sobre seu futuro.
Afinal, de acordo com recente publicação, a transferência de renda é importante para evitar mortes de crianças e mulheres. Por exemplo, o Amapá, estado onde está prevista a perfuração de um poço de petróleo, tem 60% de sua população dependente de transferência de renda e um PIB per capita de US$ 5.26 dólares. Para comparação, a da União Europeia é de US$ 37,15.
Finalmente, cremos fundamental esclarecer que há muita confusão na mídia nacional e internacional sobre a exploração nas águas territoriais brasileira. Em algumas publicações, alguns autores sugerem que haverá extração de petróleo da foz do Rio Amazonas, quando na verdade será na bacia sedimentar denominada “Foz do Amazonas”. Confundir “foz” com “bacia” é como confundir jabuti com jabuticaba.
A Rede Amazônia Azul não tem a ousadia de querer resolver todos os problemas nacionais e nem se propõe a isso! Mas os pesquisadores e professores não podemos ficar calados diante da imensa oportunidade! Mesmo porque hoje se misturam nos debates muita desinformação e forte ausência de Ciência.
Em um momento de intensos debates envolvendo igualmente a soberania nacional ou a manutenção da autossuficiência brasileira, a RAZUL se dispõe a sentar na mesa para debater, problematizar, esclarecer ou pesquisar. Sejam os problemas de exploração de petróleo, da desigualdade vergonhosa ou do meio ambiente.