O Maranhão é um dos principais estados de origem dos
trabalhadores resgatados em todo o país em trabalho escravo. A Comissão Pastoral
da Terra (CPT) mostra que de 1995 a 2011 foram resgatadas 41,6 mil pessoas.
Desses, a organização não governamental (ONG) Repórter Brasil estima que
28,31% são maranhenses.
Em Vargem Grande, no interior estado, esses trabalhadores não são apenas
números ou percentuais. Eles têm nome: José, Genival, Mateus, Sebastião, entre
outros. A Agência Brasil e a TV Brasil visitaram dois povoados na
zona rural da cidade, Riacho do Mel, com 68 famílias, e Pequi da Rampa, com 42.
Em todas as casas, há algum morador, parente ou amigo próximo que deixou a
comunidade para se submeter a péssimas condições de trabalho.
As histórias se repetem. São a falta de oportunidade no povoado e a vontade
de melhorar de vida que levam os trabalhadores a ir para estados como São Paulo,
Pará, Mato Grosso e Goiás. Grande parte trabalhou e trabalha no corte da cana.
Na maioria dos casos, antes de deixar as comunidades, eles sabem das longas
jornadas e das dificuldades que encontrarão. Mas acreditam que o esforço dos
anos fora é compensado pela geladeira, televisão ou moto - objetos mais
cobiçados - que compram quando voltam.
Na zona rural de Vargem Grande, as principais fontes de renda são a roça e o
babaçu. Com o dinheiro que se ganha, não é possível comprar mais do que o
necessário para viver e sustentar a família. Na cidade, também não há muita
oferta de emprego, o município tem um dos 300 piores índices de Desenvolvimento
Humano, ocupa a 5.293ª posição em um ranking de 5.565, segundo o Atlas do
Desenvolvimento Humano no Brasil 2013. A renda por pessoa é de R$ 165,37 por
mês.
“Na quinzena eu ganhava, em média, R$ 380, R$ 400. Aqui é dinheiro que eu não
pegava nem no ano. Melhorou muito”, diz Genival Morais da Silva. Ele tem 30 anos
e mora em Pequi da Rampa. Em 2007, passou nove meses em São Paulo, trabalhando
no corte da cana. “Quando voltei, comprei uma motosserra, uma moto e uma
geladeira. Aqui eu não ia conseguir”.
Em São Paulo, Genival dividiu um quarto com quatro pessoas. Ele acordava às
2h para fazer comida e pegar o ônibus às 5h. Trabalhava até as 16h. Quando
chegava ao barraco - como ele mesmo define - onde morava, ainda lavava a roupa e
fazia o jantar. Desse tempo, ele guarda duas fotos, pelas quais pagou R$ 8. “As
fotos são do dia 15 de agosto. Foi o dia em que o facão caiu da minha mão. Fazia
muito frio, não consegui segurar”. Quando voltou para a comunidade, Silva
casou-se e teve uma filha. Para ele, esse trabalho ficou para trás.
Cada trabalhador que vai e volta com dinheiro acaba incentivando os demais.
Foi assim na família de Maria Batista dos Reis, moradora de Riacho do Mel. Os
três filhos passaram ou passam por essa experiência. Mateus Batista dos Reis é
um deles. Trabalhou quatro anos no corte da cana, um ano como tratorista e dez
meses como motorista, tudo na mesma usina em São Paulo. Voltou com R$ 35 mil. O
dinheiro lhe deu uma casa, uma vendinha, dois açudes para pesca e um carro.
“Eu tinha uns parentes que foram para lá e chegaram com algum dinheiro. A
gente fica com aquela vontade de ir também e conseguir alguma coisa. Porque aqui
não tem serviço, não tem emprego. Vamo pra lá por conta disso”, diz Reis. Ele e
o irmão Matias estão de volta. Maria, no entanto, aguarda o retorno de Ananias,
há cinco anos em São Paulo. “Se fosse por mim, eles nunca tinham ido, mas querem
dinheiro. Não posso privar. São de maior [maior de idade]. Mas, fico preocupada
demais”, diz a mãe.
Ir é fácil. Os chamados gatos são acessíveis na cidade, eles são responsáveis
pela comunicação entre as empresas e os trabalhadores. “Toda sexta-feira sai um
ônibus ali da avenida [BR 222] cheio de gente e vai deixando. Deixa em Goiás,
São Paulo, Mato Grosso do Sul, onde eles acham lugar para ir trabalhar”, diz
Maria Helena da Silva, moradora de Pequi da Rampa e integrande da Cáritas,
entidade vinculada à Igreja Católica, que atua no combate ao trabalho escravo na
região.
De acordo com Helena, os principais destinos são São José dos Campos (SP),
para o corte da cana, e Ribeirão Preto (SP), para a construção civil. Outro
destino comum é Rio Verde (GO). “Tem uma rua lá onde todo mundo é de Vargem
Grande ou Nina Rodrigues [município vizinho]. Trabalham lá no que o pessoal de
Goiás não quer de jeito nenhum. Aí eles chamam as pessoas do Maranhão”, diz. A
principal atividade em que atuam é o abate de frango.
Edição: Fernando Fraga
Fonte: Agência Brasil
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