quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

E se a professora do seu filho fosse uma travesti?

Texto de Ana Flor Fernandes Rodrigues para as Blogueiras Feministas.
O título desse texto surgiu de questionamentos e inquietações que tenho feito cotidianamente desde que iniciei o curso de pedagogia na UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). Não obstante, do medo que parece existir quando LGBTs, neste caso específico travestis, adentram o campo minado da educação e miram na probabilidade de construir processos de ensino e aprendizagem junto aos filhos de outros.
Antes de tudo, gostaria de destacar que esse é um escrito cheio de sensações. É impossível falar dos filhos, de crianças, sem lembrar como para muitas de nós os muros das escolas se mostraram ambientes violentos. Foi no espaço escolar que aprendemos, muitas vezes, a criar mecanismos de proteção e sobrevivência. Quem diria que, algum dia, estaríamos nela novamente, mas dessa vez enquanto professoras dos filhos daqueles que de lá tentaram nos expulsar?
Pensar travestis sendo professoras é compreender que nós podemos seguir roteiros diferentes dos quais fomos submetidas. Não quero dizer com isso que existe uma regra ou um manual, mas que existem possibilidades de criar novas narrativas que abarquem o chão das escolas e os filhos de vocês. É proporcionar uma didática que se faça inclusiva, trabalhando as diferenças e o diálogo.
Tenho pontuado nos textos que escrevo que é necessário nos dar oportunidades para que uma mudança aconteça. Se não essa mudança, uma tentativa da mesma. Nós faremos, de alguma forma, parte da arquitetura da vida dos seus filhos, mesmo que esse não seja um desejo da grande maioria. Afinal, não se pode escrever qualquer linha sem esquecer como o Brasil é um país líder em transfobia.
O saber docente nos permite desfrutar de muitas coisas. Duas delas é aprender e diversificar o ensino. Com vocês, conosco, com os nossos filhos e os filhos dos seus filhos. Travestis, cada vez mais, mesmo que timidamente, estão escolhendo o tablado da educação como artificio de um novo hoje e um outro amanhã. Isso, quem sabe, significa que estamos percebendo que essa é uma “ferramenta” que pode nos fornecer subsídios.
As problemáticas que ligeiramente tento flexionar nesse curto texto em breve serão outras, espero. Assim como também espero muitas travestis gestoras, secretárias de educação, acadêmicas que debatem currículo e, por fim, professoras. Outrora, cogito que talvez os filhos de vocês, caso construam saberes junto ás professoras que são travestis, possam se edificar sujeitos que não mais nos coloquem às margens de uma sociedade transfóbica, mas que contribuam para um ensino democrático.
Também escrevo por acreditar que um dia, no jardim das delicias e dos prazeres, o fato de uma travesti professora não se fará um tabu ou um processo judicial; ou que os filhos de vocês precisem trocar de escola por muito mais vontade dos pais e familiares do que deles próprios.
Assim sendo, sinalizo mais uma vez que hoje, mais do que nunca, temos a oportunidade de estruturar novas perspectivas. Logo, nos convido para uma simples ou profunda reflexão a depender de quem ler e como ler: e se a professora do seu filho fosse uma travesti?
Autora
Ana Flor Fernandes Rodrigues, 21 anos. Graduanda em Pedagogia na Universidade Federal de Pernambuco – UFPE. Estagiária em Assistência Pedagógica na Organização Galera da Redação. Estuda e Pesquisa em temas relativos à gênero e sexualidade. Modéstia parte, uma travesti muito bonita! Militante por direitos para travestis e pessoas trans.
Créditos da imagem: Ana Flor Fernandes Rodrigues, foto pessoal.

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