sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

“Literatura, cidade e futebol: Humberto de Campos e o Sampaio Corrêa”

Foto: Blog Roteirando Slz

Por Jorge Antonio Carvalho*

O Sampaio Corrêa parte em viagem para Humberto de Campos, e não é apenas o ônibus que corta estradas e poeiras: é a própria história que se desloca, carregando consigo o peso de derrotas recentes, a sombra de gestões sem credibilidade, e a esperança tênue de que, ao chegar à cidade que leva o nome de um dos maiores escritores maranhenses, possa encontrar no espírito modernista de Humberto de Campos um espelho, uma advertência, talvez até um sopro de renovação.

Mas Humberto de Campos não é apenas o nome de um poeta. É também uma cidade costeira, de mar aberto e dunas que se movem com o vento, localizada a pouco mais de 150 quilômetros de São Luís. Com cerca de 26 mil habitantes, o município guarda uma paisagem de mangues, praias e rios que se confundem com a memória de seus moradores. Ali, o cotidiano é marcado pela pesca, pela simplicidade das feiras e pelo ritmo lento das marés, um contraste com a urgência do futebol, que exige resultados imediatos e vitórias rápidas.

Humberto de Campos

Em A Mulher Dormida, Humberto desenhou a imagem da estagnação, do corpo imóvel diante da vida que passa. O clube, atolado em gestões que não despertam confiança, lembra essa mulher adormecida, incapaz de abrir os olhos para o novo dia. Mas Humberto também escreveu O Amor Volta, lembrando que a paixão, mesmo ferida, pode renascer; que o vínculo, mesmo esgarçado, pode ser reconstruído. É nesse ponto que repousa a esperança da Bolívia Querida: acordar do torpor, reinventar-se, devolver à torcida o orgulho que se perdeu nas madrugadas de derrotas e nas tardes de apatia.

O futebol, como a literatura, é mais do que espetáculo: é expressão da cultura popular, é voz coletiva, é memória viva. Humberto de Campos, a cidade, com suas praias e mangues, lembra que o Maranhão é feito de resistência e beleza. Humberto de Campos, o escritor, lembra que é preciso romper barreiras para dar voz ao povo. O Sampaio precisa fazer o mesmo: abandonar a apatia, abrir-se ao povo, recuperar sua identidade. Só assim deixará de ser figurante e voltará a protagonizar sua própria narrativa.

Foto: Redes Sociais

Viajar para Humberto de Campos é, portanto, mais do que  uma pré-temporada: é um chamado à memória, um convite à reinvenção. Que o clube, ao pisar naquela terra, se lembre do escritor que ousou desafiar o tempo e que, como ele, encontre coragem para virar a página. Porque, no fundo, o futebol é também literatura: cada jogo é um capítulo, cada gol é uma metáfora, cada derrota é uma vírgula que prepara o renascimento da frase seguinte.

*Crônica literária jornalística de Jorge Antonio Carvalho, oficial do blogue.