quinta-feira, 21 de setembro de 2023

ARTIGO: Quilombos Urbanos na Ilha do Maranhão


Gerson Pinheiro de Souza*

Uma questão que remonta ao movimento negro pré-Constituição de 88 e ganha fôlego com a conquista do Estatuto da Igualdade Racial e demais políticas afirmativas destinadas à população negra continua presente junto aos movimentos sociais organizados dos bairros de maior concentração negra da grande São Luís: a presença dos quilombos urbanos, suas gênesis, motivações, e atualmente a necessidade de auto reconhecimento, auto declaração e reconhecimento pelo Estado Brasileiro.

É perceptível que esse fenômeno, no Maranhão por exemplo, tem origem diversa da conceituação clássica que reconhece quilombos urbanos enquanto espaços nos quais residiam os negros livres ou escravos de ganho, de onde se dirigiam para o centro das cidades para a realização cotidiana de serviços e que com o crescimento das cidades foram anexados às suas zonas urbanas. Ora, parte significativa dos bairros negros da Grande São Luís surgiu ou teve seu povoamento adensado entre 1960 e 1991, período no qual o estado foi fortemente marcado pela desterritorialização de comunidades rurais, em especial das Comunidades Rurais Quilombolas (CRQs), consequência do advento dos grandes projetos que prometiam colocar o estado na rota do desenvolvimento capitalista.

Como consequência da lei de terras do então governador José Sarney (Lei n° 2979/1969) somou-se à área já ocupada pelos “coronéis” regionais grandes porções de terra, por ação dos novos latifundiários. “Chicotes e bacamartes deram as mãos a motosserras e modernos fuzis” na tarefa de, desrespeitando a presença de quilombos e terras indígenas, entregar a Pré-Amazônia Maranhense para os grandes empreendimentos e construir o “Maranhão Novo”. Enquanto isso, grandes outdoors foram colocados na entrada da Ilha do Maranhão, na qual fica a capital, prometendo que a partir de grandes plantas industriais, capitaneadas pelas empresas Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) e Alumínios do Maranhão (ALUMAR) ter-se-ia pleno emprego, água potável, educação, saúde e muito mais.

O resultado se expressou no esvaziamento das CRQs e no inchaço populacional da capital. Como já referido, entre 1960 e 1991 (segundo o IBGE) a população residente saltou de 158.292 para 696.353 habitantes. O período se caracterizou pelas ocupações periféricas e desordenadas dos municípios da Ilha do Maranhão.

Após a frustração por não encontrar o prometido emprego e impedido de retornar às CRQs, então já ocupadas pelo latifúndio, longe de suas raízes e sujeitas a toda sorte de desestruturações culturais, religiosas e familiares restou a essas populações ocuparem as áreas socialmente periféricas e insalubres dos manguezais da ilha, buscando principalmente áreas que fossem relativamente próximas de equipamentos públicos e espaços habitacionais que lhes permitissem complementar o sustento retirado dos mangues com a comercialização de produtos oriundos da coleta, em especial frutos do mar, e a prestação de serviços.

Os bairros resultantes dessas ocupações ou por elas adensados, a despeito de terem se tornado espaços urbanos consolidados em consequência da resistência e intensa luta de suas populações por equipamentos públicos e reconhecimento de seus direitos, continuam a figurar entre os mais carentes da zona urbana a exemplo da Região da Liberdade, Polo Coroadinho, Bairro de Fátima, Anjo da Guarda, Vila Palmeira/Santa Cruz dentre outros. Esses bairros guardam características que os relacionam culturalmente às CRQs de origem; mesmo décadas depois é possível identificar colônias completas de pessoas oriundas de territórios quilombolas da Baixada, Litoral Ocidental e outras regiões de forte presença negra.

O fato de que essas populações foram arrancadas dos territórios quilombolas tradicionais, e levados a optar pela fixação de moradia nos mangues e apicuns das margens dos rios da Ilha do Maranhão, nos motiva a propor a assertiva de que se constituem verdadeiros “Quilombos Urbanos Transplantados”. Merecendo por parte do Estado Brasileiro reconhecimento jurídico e politicas afirmativas de forma similar às Comunidades Rurais Quilombolas.

*Geógrafo / Secretário de Igualdade Racial do Estado do Maranhão.

Pastores golpistas prometiam rentabilidade estratosférica: “Octilhão”

Pastor Osório, um dos investigados

Estelionatários diziam que com um depósito de apenas R$ 25 as pessoas poderiam receber de volta nas “operações” o valor de R$ 1 octilhão.

Com boa lábia e forte apelo nas redes sociais, o pastor Osório José Lopes Júnior (foto em destaque) conseguia ludibriar fiéis e fazer com que eles investissem suas economias em falsas operações financeiras ou falsos projetos de ações humanitárias, com promessa de retorno financeiro imediato e rentabilidade estratosférica, segundo o Metrópoles.

Invocando uma teoria conspiratória apelidada de “Nesara Gesara”, os estelionatários diziam, por exemplo, que com um depósito de apenas R$ 25 as pessoas poderiam receber de volta nas “operações” o valor de R$ 1 octilhão (ou 1 seguido de 27 zeros: R$ 1.000.000.000.000.000.000.000.000.000). Para se ter ideia da quantia prometida, ela é bilhões de vezes superior à do PIB mundial (em 2022, a soma de todas as riquezas produzidas no mundo foi de US$ 101,6 trilhões).

A investigação aponta que os suspeitos formavam uma rede criminosa muito bem organizada, com estrutura ordenada e divisão de tarefas, especializada no cometimento de diversos crimes, como falsidade ideológica, lavagem de dinheiro, sonegação fiscal e estelionatos por meio de redes sociais. Osório Júnior é considerado foragido.

A ação é coordenada pela Delegacia de Repressão aos Crimes Contra a Ordem Tributária (Dot), vinculada ao Departamento de Combate a Corrupção e ao Crime Organizado (Decor).

O golpe pode ser considerado um dos maiores já investigados no Brasil, uma vez que foram constatadas, como vítimas, pessoas de diversas camadas sociais e localizadas em quase todas as unidades da Federação, estimando-se mais de 50 mil vítimas.

Fonte: A Postagem

terça-feira, 19 de setembro de 2023

Humilhação de boas-vindas


Tapas, socos e cuspe no rosto, humilhações públicas e em meios digitais. A lista de constrangimentos relatados pelos calouros no trote da faculdade de medicina da Unisa (Universidade Santo Amaro), em São Paulo, é extensa. Inclui faxinar a casa de veteranos, ajoelhar-se para ouvir xingamentos aos gritos, aceitar apelidos --inclusive de cunho racista--, seguir regras de vestimenta e de circulação, além de enviar ou receber fotos de genitais masculinos por redes sociais ou aplicativos de mensagens. É cobrado também que se demonstre conhecimento sobre o histórico de uma cultura de abusos que se arrasta há anos, de acordo com alunos e ex-alunos, que serão apresentados com nomes fictícios.

O UOL investigou por dois meses relatos que envolviam estas práticas na universidade.

A lei 10.454 do estado de São Paulo proíbe trotes "sob coação, agressão física, moral" ou outros constrangimentos que representem risco à saúde ou à integridade física dos alunos desde 1999. Quem pratica corre o risco de expulsão e de sofrer sanções penais e civis. As universidades devem adotar medidas para impedir o trote e punir os infratores. Caso contrário, responderá por omissão ou condescendência.

A reportagem ouviu estudantes e egressos do curso de medicina na condição de anonimato e teve acesso a documentos e conversas de grupos no WhatsApp, além de um perfil no Instagram com denúncias sobre os trotes, que saiu do ar. "Contas que violam as Diretrizes da Comunidade do Instagram podem ser removidas", afirma a Meta, empresa dona da rede.

Procurada ao menos 13 vezes pela reportagem, que chegou a ir a 2 dos 4 campi, a Unisa não se pronunciou. A atlética negou relação com os abusos e, assim como o centro acadêmico, afirma ser contra o trote.

No últmo final de semana, ganharam repercussão e provocaram revolta vídeos nos quais alunos homens de medicina da mesma universidade e do Centro Universitário São Camilo abaixam as calças durante um torneio amistoso de vôlei feminino.

A reportagem ouviu relatos de que os trotes violentos acontecem pelo menos desde 2009.

A coerção ocorre não só no próprio campus onde fica o prédio da medicina, no Jardim das Imbuias, zona sul de São Paulo, mas também em repúblicas, festas, viagens a sítios no interior e nos jogos universitários. Parte das imposições consta em um manual enviado por celular aos novatos já nos primeiros dias de aula. Quem se submete cria, em troca, a expectativa de conseguir uma vaga de residência no futuro. Quem se recusa a participar sofre com as consequências da exclusão mesmo depois de formado.

Em um informe de 2011, a Unisa anunciou a proibição de "qualquer tipo de trote que cause constrangimento aos alunos", de acordo com orientações do Ministério Público. Em janeiro de 2022, a universidade lançou a página Diga Não ao Trote, que reforça a mensagem da proibição e a "importância de uma recepção acolhedora".

Veja a matéria completa da Uol no link abaixo: 

segunda-feira, 18 de setembro de 2023

Fentanil: como nova onda de overdoses assola EUA e mata quase 300 por dia

Mulher fumando fentanil em rua de Los Angeles,
Estados Unidos 
(GETTY IMAGE)
 
Por Nadine Yousif

Cada vez mais americanos morrem por overdose de fentanil, à medida que uma nova onda da epidemia de opioides começa a se espalhar pelas comunidades dos quatro cantos do país.

Há seis anos, Sean morreu de uma overdose acidental por fentanil em Burlington, no Estado de Vermont. Ele tinha 27 anos.

"Cada vez que ouço falar de uma perda devido ao abuso de substâncias, meu coração se parte um pouco mais", escreveu a mãe dele, Kim Blake, em um blog dedicado ao filho em 2021.

"Mais uma família despedaçada. Sempre de luto pela perda de sonhos e celebrações."

Naquele ano, os Estados Unidos testemunharam um marco sombrio: pela primeira vez, as overdoses mataram mais de 100 mil pessoas em todo o país num único ano.

Dessas mortes, mais de 66% estavam ligadas ao fentanil, um opioide sintético 50 vezes mais poderoso que a heroína.

O fentanil é um produto farmacêutico que pode ser prescrito por médicos para tratar dores intensas.

Mas a droga também é fabricada e vendida por traficantes. A maior parte do fentanil ilegal encontrado nos EUA é traficado a partir do México e usa produtos químicos provenientes da China, de acordo com o Drug Enforcement Administration (DEA), órgão federal encarregado da repressão e do controle de narcóticos

Em 2010, menos de 40 mil pessoas morreram por overdose de drogas em todo o país, e menos de 10% dessas mortes estavam ligadas ao fentanil.

Naquela época, as mortes eram causadas principalmente pelo uso de heroína ou opioides prescritos por profissionais de saúde.

A mudança de cenário é detalhada num estudo divulgado recém-publicado por pesquisadores da Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA).

O trabalho examina as tendências nas mortes por overdose no país entre 2010 e 2021, utilizando dados compilados pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA.


Os dados mostram claramente como o fentanil redefiniu as overdoses nos Estados Unidos na última década.

"O aumento do consumo de fentanil fabricado ilicitamente deu início a uma crise sem precedentes", escreveram os autores do artigo.

Praticamente todos os cantos dos EUA — do Havaí a Rhode Island — foram tocados pelo fentanil.

O aumento das mortes relacionadas à droga foi observado pela primeira vez em 2015, revelam as estatísticas.

Desde então, o entorpecente se espalhou pelo país e a taxa de mortalidade cresceu de forma acentuada.

"Em 2018, cerca de 80% das overdoses por fentanil aconteceram a leste do rio Mississippi", disse à BBC Chelsea Shover, professora assistente da UCLA e coautora do estudo.

Mas, em 2019, "o fentanil passa a fazer parte do fornecimento de drogas no oeste dos EUA e, de repente, esta população que estava resguardada também ficou exposta, e as taxas de mortalidade começaram a subir", segundo a pesquisadora

Na pesquisa recente, os especialistas alertam para outra tendência crescente: as mortes relacionadas ao consumo de fentanil em conjunto com drogas estimulantes, como a cocaína ou a metanfetamina.

Essa tendência é observada em todos os EUA, embora de formas diferentes devido aos padrões de consumo que diferem de região para região.

Os investigadores encontraram, por exemplo, taxas de mortalidade mais elevadas relacionadas ao consumo de fentanil e cocaína em Estados do nordeste dos EUA, como Vermont e Connecticut, onde os estimulantes geralmente são de fácil acesso.

Mas em praticamente todos os cantos do país, da Virgínia à Califórnia, as mortes foram causadas principalmente pelo uso de metanfetaminas e fentanil.

Blake, que também é médica, disse que seu filho usava cocaína esporadicamente, embora o exame toxicológico tenha encontrado apenas fentanil em seu organismo.

Ela aprendeu que muitos misturam diferentes substâncias para obter uma sensação prolongada.

"Não é nenhuma surpresa para mim esse aumento tão grande nas combinações de estimulantes e opioides", observa Blake.

Quando o fentanil chegou pela primeira vez aos EUA como parte do tráfico, "muitas pessoas não o queriam", lembra Shover. Mas o opioide sintético tornou-se amplamente disponível porque é mais barato de produzir em comparação com outras drogas.

Ele também é altamente viciante — isso significa que dependentes ficam expostos ao entorpecente e muitas vezes o procuram como uma forma de evitar abstinências dolorosas relacionadas a outras substâncias.

Nos EUA, o estudo identificou que Alasca, Virgínia Ocidental, Rhode Island, Havaí e Califórnia como os Estados com as taxas mais elevadas de mortes por overdose em que há mistura de fentanil e estimulantes.

Esses locais têm taxas historicamente altas de uso de drogas, segundo Shover. Com a chegada do fentanil, esse consumo tornou-se ainda mais letal.

Pessoa em overdose é atendida por médicos nas ruas de
Vancouver, Canadá (GETTY IMAGES)

Um problema que atravessa classes sociais

A crise dos opioides tem sido tradicionalmente retratada como um "problema dos brancos", destaca Shover.

No entanto, o estudo recente revelou que os afro-americanos estão morrendo ao combinar fentanil e estimulantes a taxas mais elevadas, em todas as faixas etárias e limites geográficos.

Para Rasheeda Watts-Pearson, especialista em redução de danos baseada em Ohio, nos EUA, os dados refletem o que é visto na prática.

Ela faz um trabalho de divulgação com a A1 Stigma Free, uma organização fundada há apenas oito meses para combater um aumento notável de mortes por overdose na comunidade afro-americana de Cincinnati.

Como parte do trabalho, Watts-Pearson visita frequentemente barbearias, bares e mercearias para falar com as pessoas sobre os impactos do fentanil.

Ela considera que há falta de conscientização sobre o tema, motivada em parte pelas disparidades históricas de saúde vivenciadas por grupos raciais e étnicos.

Mesmo as campanhas de marketing feitas para conscientizar sobre a crise dos opioides não incluem a experiência dos negros americanos, critica ela.

"Se eu dirigir até a cidade de Avondale agora mesmo, há um outdoor que fala sobre a 'Crise dos Opioides', mas na mensagem aparecem duas pessoas brancas”" exemplifica Watts-Pearson.

Ela aponta que as drogas misturadas com fentanil são uma grande barreira para a comunidade. Segundo a ativista, muitas pessoas acabam consumindo o entorpecente sem saber — e desenvolvem uma dependência.

"Os legistas veem pessoas com overdose que morreram por causa de cocaína, crack e vestígios de fentanil", diz ela.

"Isso está infiltrado na comunidade negra e não há gente suficiente falando sobre o assunto."

Rasheeda Watts-Pearson (à esquerda) tem trabalhado com A1 Stigma Free
para aumentar a conscientização sobre o impacto da epidemia de fentail
na comunidade afro-americana de Cincinnati, Ohio

Uma quarta onda

O abuso de fentanil em combinação com outras drogas marca o início de uma "quarta onda" da crise nos EUA, avaliam os pesquisadores.

A primeira onda de overdoses aconteceu no final dos anos 1990, com mortes por opioides com prescrição médica. Em 2010, houve uma segunda onda de overdoses, dessa vez causadas por heroína. E em 2013, surgiu uma terceira onda, graças à proliferação de drogas ilícitas análogas ao fentanil.

Especialistas como a professora Shover alertam que as opções de tratamento para a quarta onda não acompanham a demanda.

"Nosso sistema de tratamento contra dependência geralmente se concentra em uma droga de cada vez", conta ela.

"Mas a realidade é que muitos usuários usam mais de um tipo de droga."

Para manter viva a memória de seu filho, Blake decidiu falar abertamente sobre a perda e tenta ajudar outras famílias a passar pela mesma dor.

"Todo mundo tem uma história e, para um pai que perdeu um filho, isso dura para sempre", diz ela.

Seu filho fez tratamentos contra dependência algumas vezes.

A experiência ensinou à Blake que as opções terapêuticas variam de Estado para Estado e, em muitos casos, o que está disponível não é suficiente.

"O ideal seria que as pessoas recebessem tratamento rapidamente, sempre que quisessem e a longo prazo", destaca ela.

Blake também sugere a criação de locais para a prevenção de overdose, onde as pessoas pudessem usar drogas com segurança e sob supervisão.

Esses lugares estão amplamente disponíveis no Canadá — que tem a sua própria crise de fentanil — mas existem apenas duas instalações do tipo nos EUA inteiro.

Acima de tudo, Blake apelou à compaixão e à compreensão para aqueles que lutam contra o uso de substâncias.

"A maioria das pessoas com quem converso dizem que seus filhos não queriam morrer."

Pesquisadores listam fatores associados à depressão

Foto: Harol Bustos/Quanta Magazine

Em uma pesquisa publicada na
Nature Mental Health, uma equipe internacional de pesquisadores analisou uma combinação de fatores, incluindo fatores de estilo de vida, genética, estrutura cerebral e sistemas imunológico e metabólico para identificar os mecanismos associados à depressão.

Eles descobriram, por exemplo, que uma vida sedentária, sono de má qualidade e vícios como o álcool e o cigarro aumentam o risco da doença.

Detalhes do estudo

Para compreender melhor a relação entre estes fatores e a depressão, os investigadores recorreram ao UK Biobank, uma base de dados que contém informações sobre genética, estilo de vida e saúde dos seus participantes.

Ao examinar dados de quase 290 mil pessoas – das quais 13 mil tiveram depressão – acompanhadas ao longo de um período de nove anos, a equipe conseguiu identificar sete fatores de estilo de vida associados a um maior risco de depressão. Estes foram:

- consumo moderado de álcool
- dieta saudável
- atividade física regular
- sono saudável
- nunca fumar
- comportamento sedentário baixo a moderado
- conexão social frequente

De todos estes fatores, ter uma boa noite de sono – entre sete e nove horas por noite – fez a maior diferença, reduzindo o risco de depressão, incluindo episódios depressivos únicos e depressão resistente ao tratamento, em 22%.

A ligação social frequente, que em geral reduziu o risco de depressão em 18%, foi a que mais protegeu contra o transtorno depressivo recorrente.

O consumo moderado de álcool diminuiu o risco de depressão em 11%, a dieta saudável em 6%, a atividade física regular em 14%, nunca fumar em 20% e o comportamento sedentário baixo a moderado em 13%.

A equipe então examinou o DNA dos participantes, atribuindo a cada um uma pontuação de risco genético. Essa pontuação foi baseada no número de variantes genéticas que um indivíduo carregava e que tinham uma ligação conhecida com o risco de depressão. Aqueles com a pontuação de risco genético mais baixa tinham 25% menos probabilidade de desenvolver depressão quando comparados com aqueles com a pontuação mais alta – um impacto muito menor do que o estilo de vida.

Em pessoas com risco genético alto, médio e baixo para depressão, a equipe descobriu ainda que um estilo de vida saudável pode reduzir o risco de depressão. Esta pesquisa destaca a importância de viver um estilo de vida saudável para prevenir a depressão, independentemente do risco genético de uma pessoa.


quinta-feira, 14 de setembro de 2023

Racismo e injúria racial no mercado de trabalho

 Foto: Reprodução/Sintrapavsp

Hoje em dia, a discriminação racial é tão comum que chega a ser invisível para quem não é vítima. Abolimos a escravidão física, os chicotes, troncos, grilhões e demais instrumentos de tortura, mas ainda mantemos viva na mente a escravidão do preconceito, repetida por séculos. As condutas racistas podem ser definidas como um sentimento de superioridade biológica, cultural, moral de determinada raça, povo ou grupo social considerado como raça. São manifestações da crença na existência de raças humanas distintas e superiores umas às outras.

Essa convicção foi utilizada no passado para justificar a escravidão, o domínio de alguns povos sobre outros, os genocídios e um dos maiores crimes contra a humanidade: o nazismo. Mas, mesmo em pleno século XXI, com tantas leis criminalizando condutas racistas, engana-se quem pensa que não ocorrem atos discriminatórios e preconceituosos, ainda que velados. E as principais vítimas são mesmo pessoas da raça negra.

Diante das novas legislações e políticas afirmativas, as empresas hoje têm buscado aplicar métodos e estratégias para o combate à discriminação e ao racismo, proibindo condutas discriminatórias, assédio e todas as formas de opressão exercidas sobre empregados com base em diferenças raciais. Mas, ainda existem aqueles empregadores indiferentes a essa nova mentalidade, que demonstram preconceito em relação ao trabalhador negro. Isso pode ser verificado pela grande incidência de processos na Justiça do Trabalho mineira, que denunciam a prática de racismo e de injúria racial no ambiente de trabalho.

Etarismo

Preconceito relacionado à idade, o etarismo prejudica a saúde, afeta a dignidade, nega às pessoas direitos humanos e impacta a habilidade de cada indivíduo alcançar seu pleno potencial.

Quando o preconceito é racial, as consequências também são inúmeras. A população negra enfrenta o racismo estrutural, institucional e a ausência de políticas públicas para combatê-lo.

Há interseccionalidades entre ambos os preconceitos. É preciso analisar como esses marcadores sociais impactam diretamente na saúde e vão sendo cada vez mais decisivos com o envelhecimento.

Estudo da Faculdade de Saúde Pública da USP aponta que 47,2% dos idosos negros avaliam sua saúde de maneira negativa, bem como 45,5% dos idosos pardos. Já entre idosos brancos, o índice é de 33%.

Em relação ao acesso aos serviços de saúde, segundo o mesmo estudo, na cidade de São Paulo, os equipamentos de saúde são acessado por: 63,3% brancos, 21,4% pardos e 7,3% pretos/negros.

Os números refletem uma desigualdade latente e desafiam autoridades e a sociedade, como um todo, a criar, implementar e ampliar medidas e políticas que ajudem a mudar essa realidade.

Fonte: AMB e TRT(MG)

terça-feira, 5 de setembro de 2023

4 atitudes que enfraquecem o vínculo emocional com os filhos


Ser pai, mãe, avô, avó e um educador eficaz, não é fácil. Cada criança chega ao mundo com necessidades próprias que devemos saber atender (e entender), com virtudes a serem potencializadas e emoções que devem ser incentivadas, orientadas e desenvolvidas.

Educar não é apenas ensinar as crianças a ler ou mostrar como se faz uma pesquisa no computador. Ser pai ou mãe não é oferecer telemóveis nos anos, nem garantir que os cintos de segurança estão postos antes de arrancar com o carro. É isto e muito mais.

Educar também é saber dizer “Não” e ao mesmo tempo, dizer “Sim” com o olhar. Porque educar não é apenas proibir, mas também abrir o coração aos nossos filhos e reforçar cada dia o vínculo emocional que temos com eles, dando a entender que estamos juntos em cada instante para proporcionar-lhes maturidade como pessoas felizes e capazes.

No entanto, muitas vezes, embora conheçamos a teoria não a aplicamos na prática. Além de pais e mães, também somos um casal, somos empregados, empresários ou pessoas que querem trocar de emprego e que, possivelmente, ainda querem atingir novos objetivos profissionais. Tudo isto acontece concomitantemente no nosso quotidiano e, sem saber como, começamos a cometer erros na educação dos nossos filhos.

Todos os pais já foram filhos. Se pensarmos no nosso passado, conseguimos perceber aquilo que valorizamos mais nos nossos pais ou aquilo que mais sentimos falta na nossa infância. Se a sua infância não foi especialmente feliz, entenderá quais os aspectos que romperam este vínculo emocional com os seus pais, e esses erros são exatamente aqueles que não quererá repetir com os seus filhos

Deixamos aqui, para reflexão, as 4 atitudes que enfraquecem o vínculo emocional com os filhos:

1. Não saber ouvir/escutar

As crianças falam (muito) e fazem muitas perguntas. Apanham-nos de surpresa e fazem 1000 perguntas sobre o mundo, e centenas de comentários muitas vezes nos momentos mais inoportunos. Querem saber, experimentar, querem partilhar e compreender tudo que acontece à sua volta.
Se as mandar ficar sossegadas, se as obrigar a ficar em silêncio ou se em vez de lhes dar as respostas tão esperadas lhes falar severamente ou de forma agressiva, isso fará com que, a curto prazo, a criança deixe de se dirigir a si. E irá encontrar os seus próprios espaços de solidão, atrás de uma porta fechada esperançada que o pai ou a mãe não a descubram.

2. Castigos

São muitos os pais que relacionam a palavra educação com punição, com proibição, com um autoritarismo firme e rígido em que tudo se impõe e qualquer erro é castigado. Este tipo de conduta educativa resulta numa baixa autoestima, na insegurança e, ao mesmo tempo, uma ruptura do vínculo emocional com os nossos filhos.

Se castigamos não ensinamos. Se nos limitamos a enfatizar tudo o que a criança faz de errado, jamais saberá como fazer algo bem. Não lhe estamos a dar medidas ou estratégias e limitamo-nos a humilhá-la. Esta atitude irá gerar raiva, rancor e insegurança.

3. Comparar e rotular

São poucas as atitudes que podem ser mais destrutivas do que comparar duas crianças para lhes dar a entender as suas escassas aptidões, as suas falhas, ou a sua falta de iniciativa. Um erro que muitos pais cometem é falar em voz alta à frente das crianças como se elas não os ouvissem.

“É que o meu filho não é como o teu, é mais lento…”. Expressões como estas são dolorosas e geram um sentimento negativo na criança que causará não apenas revolta e mágoa em relação aos pais, mas também um sentimento interior de inferioridade.

4. Gritar e apoiar-se mais nas ordens do que nos argumentos

Excluindo os maus tratos físicos, que não há pior forma de romper o vínculo emocional com uma criança do que cometer esse acto imperdoável. Temos de estar conscientes de que existem outros tipos de maus tratos implícitos, quase igualmente destrutivos. É o caso do abuso psicológico, no qual se arruína a personalidade da criança por completo, sua autoimagem e a confiança em si própria.

Há pais e mães que se dirigem constantemente aos filhos a gritar. Levantar a voz sem razão justificável provoca um estado de euforia e stress contínuo nos filhos; eles não sabem em que se apoiar, não sabem o que fizeram de errado. Os gritos contínuos enfurecem e são extremamente negativos já que não há diálogos, apenas ordens e críticas.

Deve-se ter muito cuidado com estes aspectos básicos. O não escutar, o não falar e o não demonstrar abertura, compreensão ou sobrepor a sanção ao diálogo são modos de afastar aos poucos as crianças dos pais. Nestes casos, as crianças começam a encarar os pais como inimigos dos quais se devem se defender e assim se rompe o vínculo emocional com eles.

Educar é uma aventura que dura a vida toda em que ninguém é um verdadeiro especialista. No entanto, se nos apoiarmos nos pilares da compreensão, do carinho e num apego saudável que proporcione a maturidade e a segurança a estes seres que são parte de nós, é meio caminho andado para criar crianças felizes!

FONTE: Up to kids


segunda-feira, 4 de setembro de 2023

Como os trabalhadores conquistaram o final de semana

Na Batalha de George Square, em 31 de janeiro de 1919, milhares de trabalhadores em greve
entraram em confronto com a polícia em um confronto sangrento sobre as demandas
por uma semana de 40 horas.

Por Taj Ali*

Quem de nós estranha a expressão “Graças a deus, finalmente é sexta!”, após uma daquelas semanas complicadas? De modo geral, nosso tempo está regulado pelos cinco dias úteis de trabalho. E os fins de semana como a oportunidade para descansar, para atividades de lazer e diversão, assim como de maior tempo para a família e amigos.

Nunca nos foi dado a conhecer nada muito além deste padrão.

Entretanto, o final de semana é um fenômeno relativamente moderno — e não nos foi entregue de bandeja! O final de semana, bem como outros direitos que temos hoje, é resultado de duros combates, a ferro e fogo, da classe trabalhadora. Passaram-se muitos anos, décadas, de luta por dezenas de milhares de trabalhadores, antes que o fim-de-semana, como nomeamos sábado e domingo hoje, pudesse existir.

Na Grã-Bretanha pré-industrial, o trabalho era determinado pelas estações do ano e pelas horas da luz natural. Além disso, os sistemas de trabalho ainda não se haviam estabelecido, ainda não existiam relógios de ponto nas fábricas, nem o controle de cada momento do dia de trabalho, como hoje acontece — seja nos escritórios ou na Amazon. De várias formas, os trabalhadores de então detinham mais controle sobre suas próprias vidas do que agora.

Logo sobreveio a consolidação do capitalismo industrial, acompanhado das formas coletivas de emprego, da padronização dos salários, e da crescente delimitação entre trabalho e (limitado) lazer. Não era nada raro para os trabalhadores fabris trabalharem por dezesseis horas em ambientes sujos e perigosos, mais exauridos pelo sufocante calor de fábricas projetadas sem janelas ou ventilação.

Para a maioria dos trabalhadores, não havia alternativa — eles eram obrigados a cumprir uma extensa e extenuante jornada, para sobreviver. Mas o equilíbrio entre tão degradante trabalho e a mitigação que o tempo de lazer proporciona, estava prestes a ser contestado.

Segunda-feira santa

Antes do estabelecimento da semana de cinco dias úteis, as segundas-feiras constituiam o ponto alto da semana para muitos trabalhadores britânicos. No início do século XVII, a tradição de absenteísmo dos artesãos especializados nas segundas-feiras tornou-se conhecida como a “Segunda-feira Santa”. Estes trabalhadores trabalhavam por inúmeras horas, de terça a sábado, e consideravam que um único dia de descanso, iniciado no sábado até o fim do domingo, era insuficiente.

O boticário e escritor John Houghton descreveu o começo deste hábito em 1861:

“Quando nas malharias, ou na fabricação de meias de seda, tecelões e tecelãs ganhavam bom pagamento pelo trabalho, era raro ver essa categoria trabalhando nas segundas e terças-feiras, mas passar a maior parte do tempo na cervejaria ou na jogatina. Entre os trabalhadores da tecelagem, o comum é beber na segunda-feira, lidar com suas dores de cabeça na terça-feira, e na quarta-feira… ter suas ferramentas quebradas”.

Os trabalhadores de várias indústrias, como as de tecelagem e de minério, eram pagos no sábado, e então tinham uma sobra de dinheiro para gastar na segunda-feira. As “Segundas Santas” eram combatidas ferozmente pelos donos das fábricas e expressivamente pelo Clero que associava tal conduta ao alcoolismo e degradação moral — no entanto, seu controle tornou-se cada vez mais difícil por parte das autoridades. Originada como hábito de um grupo de trabalhadores pouco mais especializados, a Segunda Sagrada, nos meados do século XIX, difundiu-se nas fábricas e usinas, e afirmou-se como uma instituição popular na sociedade britânica.

Para muitos, as segundas-feiras eram uma chance para recuperar-se da ressaca de uma bebedeira na noite anterior; para outros, era só outro dia.

Intrinsecamente decorrente da “Segunda Santa” foi o crescimento de uma cultura de lazer comercial, com eventos musicais e teatros apresentando encenações neste dia. Para aqueles mais sóbrios, havia a opção de passar o dia visitando o jardim botânico ou assistindo a uma partida de críquete. ‘The Jovial Cutler’, uma tradicional canção de Sheffield, do século XVIII, retrata o espírito desse tempo:

‘Brother workmen, cease your labour,   Suspenda a labuta, irmão trabalhador.

Lay your files and hammers by.   Largue de lado a lima e o martelo,

Listen while a brother neighbour   Ouça o cantar do irmão companheiro

Sings a cutler’s destiny:   Que conta a saga do cuteleiro:

How upon a good Saint Monday,   De como a Santa Segunda-feira,

Sitting by the smithy fire,   Habituados na forja e ao calor da fogueira,

We tell what’s been done o’t Sunday,   Fez nosso domingo alongar

And in cheerful mirth conspire.’  E mais alegrias inspirar.

A “Early Closing Association”

Com as “Segundas Santas” associadas a bebedeira e jogos “profanos”, as instituições religiosas, visando reduzir tal expansão, defendem a redução das horas de trabalho no sábado, o que poderia incentivar maior frequência nos domingos à Igreja. Donos das indústrias e demais empregadores, acompanharam essa medida na esperança de confrontar a tradição do absenteísmo dos trabalhadores nas segundas, e aumentar a produtividade.

Em 1842, para esta campanha, foi criada a Early Closing Association (Associação pela Antecipação do Fechamento), um grupo formalmente composto pelos trabalhadores do comércio — desejosos da redução de sua jornada aos sábados — em todo território nacional.

A Associação teve o apoio e liderança dos notáveis reformadores sociais Samuel Carter Hall e George Passmore Edwards. Este grupo tinha filiais em todo o país e pressionou o Governo, com a pretensão de assegurar as tardes livres no sábado, em troca de um dia inteiro de trabalho na segunda. O meio-período de trabalho aos sábados para os trabalhadores da indústria e fábricas só se tornou realidade 25 anos depois, através da lei do Factory Act de 1867.

Já em 1886, o parlamentar e fundador da Irish Home Rule League (Liga Irlandesa pela Autonomia Local) Myles William Patrick O’Reilly, discorreu no Parlamento sobre os méritos do fechamento antecipado e conclamou que este meio-dia livre fosse estendido a todos os funcionários públicos. Isso beneficia, disse ele, uma série de trabalhadores, inclusive os das ferrovias e do serviço postal, já que os próprios empregadores elogiam seus benefícios, em termos do ganho de produtividade e da moral da força de trabalho. Suas palavras foram veementemente contestadas pelo Secretário do Interior, Hugh Childers, ao responder que os funcionários públicos não estavam sobrecarregados, e que encerrar o expediente na metade do dia no sábado ameaçaria interesses do governo.

Mas Childers não poderia impedir o que já era uma demanda com crescente adesão pública. Trabalhadores de diferentes indústrias encontraram maneiras de solucionar seus próprios casos: trabalhadores de lojas, por exemplo, que frequentemente trabalhavam até mais tarde, apelaram à população para fazer compras no início do dia. Algumas empresas chegaram a concordar em reduzir a jornada de trabalho apenas durante a semana, mas a grande maioria acabaria por concordar que fechar mais cedo aos sábados era a melhor solução. Após décadas de campanhas e lutas dos comerciários, o Act Shop (Lei das Lojas), em 1911, foi aprovado, autorizando a metade de um dia por semana (além do domingo) como folga, para os funcionários das lojas.

Uma vez que o direito tinha sido concedido a determinados trabalhadores, era impossível deter sua propagação, não só regulando o tempo de jornada de outras categorias profissionais, como também seus desdobramentos no denominado tempo do lazer.

A introdução da saída às 15h no sábado, a que nos habituamos, não é coincidência: este novo padrão de trabalho vinha configurar e promover o progresso do futebol como o entretenimento favorito nos anos 1890, com a maioria das fábricas a fechar às 13h ou 14h. As principais ofertas de lazer foram transferidas de segunda-feira para sábado à tarde, consagrando a meia jornada, pré-dominical, como norma.

O final de semana da modernidade

No início do século XX, as centrais sindicais levaram a luta mais além, empenhando-se em assegurar um fim de semana de 2 dias completos, na fórmula de 1 semana com 40 horas trabalhadas semanais, e o compromisso de 8 horas de trabalho diário. Esta demanda ensejou muitas disputas industriais.

Como exemplo, há o ocorrido em janeiro de 1919, em Glasgow, quando milhares de ex-soldados britânicos, voltando da Primeira Guerra — são, salvos, e desempregados — disputam um mercado de trabalho quando simplesmente não havia postos de trabalho suficientes para todos. A cidade de Glasgow naquela época destacava-se como um polo de mão de obra qualificada.

A STUC, Scottish Trade Union Congress (Congresso de Uniões Sindicais Escocesas) e o Glasgow Trades and Labor Council (Conselho Sindical e Trabalhista de Glasgow) reuniram-se, e propuseram reduzir a jornada semanal nas indústrias, de 54 para 40 horas, o que permitiria que o emprego pudesse ser distribuído mais justamente. Porém, a resistência a essa proposta, por parte dos donos das indústrias, levou a uma greve de 40 horas, talvez o mais notável confronto local, em Clyde.

40.000 trabalhadores das indústrias de engenharia e construção naval de Clyde participaram. Eles conseguiram a adesão dos trabalhadores das centrais elétricas locais (de Port Pundas e Pinkston), que cortaram o abastecimento de energia para Glasgow. Milhares de mineiros, dos poços nas vizinhas Lanarkshire e Stirlingshire, logo seguiram seus passos. No espaço de poucos dias, uma explosiva greve geral estava acontecendo em Glasgow, com piquetes relâmpagos, liderados pelos ex-combatentes da Grande Guerra, “disparados” por toda a cidade.

Estima-se que aproximadamente 100.000 pessoas estiveram presentes durante a manifestação no dia 31 de janeiro de 1919, pela jornada semanal de 40 horas — a infame Batalha de George Square. Ela tornou-se conhecida como “Sexta Feira Sangrenta”, devido à resposta brutal do governo, que enviou tropas e tanques para dissolver a manifestação A violência dos cassetetes policiais resultou em muitos e graves ferimentos, inclusive em David Kirkwood — mais tarde eleito parlamentar pelo partido trabalhista que, de tão golpeado, desmaiou.

A greve não foi vitoriosa, porém deu lugar a alguns tipos de concessão, como o retorno dos trabalhadores grevistas da engenharia e construção naval que, na volta ao trabalho, passaram a cumprir uma jornada de 47h semanais em vez das 57h, a qual eles se sujeitavam antes. Mais do que isso, a greve produziu um impacto político em Glasgow, com representantes do partido trabalhista Independent Labour vencendo em 10 de seus 15 distritos eleitorais nas eleições gerais de 1922.

Um dos eleitos foi George Buchanan, sindicalista escocês, antigo estampador da indústria naval, que nunca esqueceu suas raízes. Em maio de 1925, ele fez um discurso apaixonado em defesa do projeto da Lei de Horas no Trabalho Industrial, que propunha a redução da semana de trabalho para todos os trabalhadores:

“Vi homens no trabalho, e vi rapazes, cumpridores da jornada, em pé na bancada, mas incapazes de manter os olhos abertos ao concluir suas tarefas diárias. Peço aos oponentes ao projeto das Horas que eles não esqueçam destes fatos, quando falarem como se estivessem fazendo a análise de uma situação econômica.

Eles já trabalharam em um estaleiro e viram o que acontece? Estiveram lá às 6h da manhã? Aqui ouvimos falar muito das provações, processos e problemas do comércio. Será que os honrados membros gostariam de estar em um estaleiro às 6h da manhã de um dia gelado, com o frio comendo até seus ossos, sem nada no estômago, pois se atrasariam, fazendo uma refeição decente antes de pegar no batente, das 6h até as 21h?

Já vi homens nos estaleiros que não podiam comer o desjejum porque seus estômagos estavam tão esvaziados, que não conseguiam digerir direito uma refeição quando ganhavam. Isso não era incomum, mas no entanto só ouvimos falar dos empresários e donos dos estaleiros, e alguns membros desta Casa nos levariam de volta àqueles velhos tempos, se deixássemos.”

Determinadas empresas, não deixaram de contribuir a seu modo, para o aumento da disseminação da semana de trabalho padronizada. Em 1933, a indústria química Boots tinha um estoque excedente em uma nova fábrica. A prática usual na época era demitir trabalhadores para compensar a falta de demanda. A Boots, entretanto, decidiu reduzir a semana de trabalho, permitindo que seus trabalhadores tivessem um fim se semana de 48h, para evitar demissões. Uma pesquisa realizada por Richard Redmayne depois concluiu que os trabalhadores ficaram mais satisfeitos, mais saudáveis, e menos propensos a faltar.

Não faltavam evidências de que essa prática se tornaria padrão. Os sindicatos aumentaram o número de seus membros para 3 milhões durante a Segunda Guerra, e no fim do conflito mundial ficaram mais fortes, social e politicamente.

Isto foi acompanhado pela disseminação de acordos de reconhecimento feitos por diversas indústrias no pós-guerra, que permitiu que os sindicatos, ao negociar com os empregadores, obtivessem pelo menos o básico: o fim de semana de 2 dias, o padrão básico. Por anos e anos, os sindicatos nunca deixaram de negociar acordos setoriais e, assim, no pós-guerra britânico, o fim de semana de 2 dias inteiros tornou-se norma.

“O fim de semana não foi uma graça caída dos céus. Ele é o resultado de mudanças sucessivas, advindas ao longo de uma série de lutas, com derrotas e vitórias, e da resistência inabalável do movimento da classe trabalhadora.”

Amplas coalizões com instituições religiosas e simpatizantes no Parlamento e em outras instâncias de poder foram fundamentais — inclusive com a União Europeia, que instituiu a Diretriz do Tempo de Trabalho, que em 1993 estabelecia uma semana de no máximo 48h de trabalho. Mas a força motriz que impulsionou o direito ao fim de semana, bem como muitos outros direitos ou demandas atendidas hoje, foi orientada pela classe trabalhadora organizada.

Recentemente, um projeto-piloto de semana de trabalho de 4 dias revelou-se “um grande avanço”, já que 56 empresas das 61 participantes adotaram a mudança. Os trabalhadores relataram sentir-se menos estressados e dormir melhor, e os empregadores relataram taxas maiores de satisfação dos clientes. A TUC, Trade Union Congress (Central Sindical Britânica) apoia a alteração para os 4 dias.

O movimento dos trabalhadores organizados não arrefecerá sua luta pela implantação da futura semana de 4 dias trabalhados, da mesma maneira que atuou e conquistou no passado o atual fim de semana de 2 dias. Na medida que o governo tem em vista reprimir ainda mais a força renovada do movimento dos trabalhadores, é hora de reacender o espírito de luta.


*Taj Ali é um escritor freelance. Seu trabalho é publicado no Huffington Post, Metro e no Independent.