Por Maria Dolores de Brito Mota*
O Instituto Sangari, publicou em abril deste ano, o Mapa de Violência
2012, referente aos homicídios ocorridos no Brasil em 2010, ao qual
anexou o Caderno Complementar 1, Homicídio de Mulheres no Brasil. O
autor do mapeamento, Julio Jacobo Waiselfisz declara que “São poucas as
informações sobre o tema que encontramos disponíveis ou que circulam em
âmbito nacional. Dada a relevância da questão, julgamos oportuno
elaborar um estudo específico e divulgá-lo separadamente.” (2012, p.3). A
fonte dos dados que fundamentaram o mapeamento foi Sistema de
Informações de Mortalidade – SIM – da Secretaria de Vigilância em Saúde –
SVS – do Ministério da Saúde – MS, que fornece dados relativos à idade,
sexo, estado civil, profissão e local de residência da vítima e da
ocorrência da morte. A causa da morte se baseia na indicação de mortes
por agressão de terceiros.
Apresentando uma perspectiva histórica dos homicídios, o relatório
revela que entre 1980 e 2010 foram assassinadas aproximadamente 91 mil
mulheres no país, passando de 1.353 para 4.297 mortes, um aumento de
217,6% nas mulheres vítimas de assassinato, sendo 43,5 mil só na última
década (2000 – 2010). A taxa desses assassinatos para cada grupo de 100
mil mulheres passou de 2,3 em 1980, para 4,4 em 2010. Isso representa
uma média de 4.350 mulheres assassinadas por ano, 362,5 por mês, 12,1
por dia, ou seja, a cada duas horas, uma mulher é assassinada no país.
Esse estudo identifica o ano de 1996 como um corte de aumento, quando
o número desses crimes duplicou, permanecendo até o momento nos mesmos
patamares. Ressalta que, em 2007, ano seguinte à criação da Lei Maria da
Penha (2006), de combate à violência doméstica e familiar contra a
mulher, houve uma pequena redução que levou essa taxa para 3,9, mas
retomando imediatamente os níveis anteriores. Com base nos dados de
2010, as armas utilizadas nesses crimes foram em 53% dos casos armas de
fogo e o restante é representado por objetos cortantes e perfurantes
(26%) contundentes (8,3) e estrangulamento ou sufocação (6,2) e outros
meios (5,5). A residência foi apontada em 40% das ocorrências como o
local em que as mulheres foram assassinadas.
Em termos absolutos São Paulo registrou o maior número, 663
assassinatos de mulheres e Roraima o menor com 11 casos. Por cada 100
mil mulheres, a maior proporção foi encontrada em Espírito Santo, 9,4 e a
menor no Piauí com 2,6. O estado do Ceará teve 165 mulheres
assassinadas naquele ano, ocupando o 17º lugar, com taxa de 3,7 e em
termo absolutos ficou na décima posição.
O estudo observa a frequência dos crimes nas capitais, e em termos
relativos: Porto Velho ficou com a maior taxa por 100 mil, 12,4, e
Brasília a menor, 1,7; em números absolutos a primeira posição ficou com
São Paulo com 153 crimes contra mulheres e Fortaleza com 68, ficou na
sétima posição. O mapa apresenta esses crimes por município, tendo
considerado apenas aqueles com população feminina acima de 26.000, o que
corresponde a 578 municípios.
Observando a idade das vitimas, 28% tem idade entre 15 e 59 anos,
sendo a faixa etária de maior incidência, a de 20 a 29 anos com 7,7%,
representando 1.331 crimes para o ano de 2010.
Os dados que balizaram o estudo Sangari, não dispõem de dados de
gênero que possam evidenciar o caráter desses crimes como crimes de
gênero. Mas, nos estudos sobre violência já existe um consenso quanto ao
fato que a violência tem um caráter de gênero e nos estudos sobre
assassinatos de mulheres mais de 90% ocorrem por questão de gênero, são
feminicídios.
Os feminicídios têm desafiado movimentos feministas e governos
comprometidos com a garantia dos direitos das mulheres à vida, e a uma
vida sem violência. Esse pode ser, no momento, o centro da questão dos
direitos humanos das mulheres, tema definitivamente consolidado na
agenda política internacional.
Os Estados que se comprometem com a adoção de políticas públicas e
medidas adequadas e apropriadas para assegurar os direitos humanos das
mulheres devem incluir em suas ações a implementação de sistemas de
informações eficientes para investigar as condições desses crimes. No
Brasil, como em diversos países do continente latino americano, esses
estudos não estão sendo realizados pelo Estado. Mas, combater e punir
requer conhecer.
Na medida em que nos adentramos na investigação sobre as mortes
violentas de mulheres, especialmente àquelas decorrentes de conflitos
amorosos ou sexuais percebemos novas dimensões que desafiam o
conhecimento. Embora sejam assassinatos quase sempre cometidos por
maridos, ex-maridos, namorados e ex-namorados, decorrentes de situações
de rupturas do relacionamento ou de ciúme, ocorrem outras modalidades
também em circunstancias de gênero, além de vitimarem outras pessoas
como filhos, parentes e amigos das mulheres que estão na mira da
violência. É urgente a criação de um sistema de informação nacional
sobre feminicídio no Brasil, para fundamentar a reflexão de sua
tipificação penal neste momento em que se discute um novo Código Penal
Brasileiro. Discussão que já está na pauta de quase todos os países da
América Latina e do Caribe.
O feminicidio deve ser tipificado como crime hediondo, decorrente de
motivações de gênero, triplamente qualificado como fútil, traiçoeiro e
cultural, sem direito a fiança e nem recurso.
*Maria Dolores de Brito Mota
Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Gênero, Idade e Família da Universidade Federal do Ceará- NEGIF/UFC - UFC (líder) | |||||||
NUMAPP - Núcleo Multidiciplinar de Avaliação de Políticas Públicas - UFC (pesquisador) | |||||||
Fotos postadas pelo blogueiro |
Fonte: Escrevinhador
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