quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Nas próximas eleições, será melhor avançar do que retroceder


Por Gilberto de Souza*
 
Todos aqueles que não vieram para a vida a passeio e, tão logo perceberam-se no Brasil de meados do século passado até o início do atual, numa sociedade em transformação acelerada de um estágio fascista e ditatorial para a democracia e o socialismo, ou trataram de integrar o conjunto de partidos da esquerda e somaram esforços para a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva e, em seguida, de Dilma Rousseff, ou se deixaram levar no bico dos tucanos para as plagas do neoliberalismo. Há uma miríade de siglas entre os principais expoentes do pluripartidarismo nacional, mas a divisão situa-se, de fato, entre o PT, o aliado de centro, PMDB, e na outra ponta o PSDB e seus penduricalhos da direita raivosa.
 
Quanto a este último, que se alia às forças mais retrógradas, conservadoras e racistas da sociedade brasileira, fica evidente o esvaziamento após mais de uma década distante do Planalto. Míngua, sem a fonte maior de prestígio e, claro, de recursos para levar adiante os planos mais mequetrefes de reduzir o Estado para encher a burra dos endinheirados, como reza a cartilha do capitalismo internacional. Os tucanos e seus semelhantes, no entanto, apesar de esvaídos em nível nacional, seguram-se na cornucópia paulista de onde brotam trens superfaturados, arranjos com a mídia aliada e um discurso que as igrejas fundamentalistas, Católica ou protestantes, batem palminhas.
 
O sopro de cidadania que o país recebeu das urnas, na última década, porém, não deixa dúvidas à maioria dos eleitores (e eleição se vence com a maioria dos votos) de qual dos dois lados está disposto a encerrar o pior capítulo, o mais obscuro tempo já vivido pela jovem nação brasileira. Os conservadores tucanos, na direção oposta dos progressistas, querem de volta a qualquer custo (qualquer custo mesmo, e até golpe serve) os padrões sociais que fizeram a alegria de alemães e italianos na década de 30. O fascismo e o nazismo, este último escorraçado após a tentativa de solução final contra os judeus, deixaram marcas profundas na forma como uma parte dos brasileiros define o conceito de bem estar social. Colonialismo dá nisso.
 
Meia hora nas redes sociais será suficiente para perceber que o racismo, a intolerância e a opressão dos mais ricos sobre os mais pobres encontram um número assustador de simpatizantes. Mesmo no convívio familiar, no ambiente de trabalho, nas escolas, nos bares, percebe-se que – embora em ruidosa minoria – não falta quem seja contra a política de cotas raciais, faz piada com o Programa Bolsa Família, despreza direitos fundamentais ao ser humano como o transporte acessível e confortáveis a todos, um lugar seguro e decente onde morar, a terra para quem nela trabalha, emprego digno, alimentação correta, política honesta.
 
Sem uma solução para estas questões, porque o capitalismo não oferece tais opções senão com a manutenção da miséria, das crises econômicas, da usura e do egoísmo na acumulação desenfreada de bens, resta aos conservadores elevar a voz, amplificada por meios de comunicação vendidos aos interesses dos patrões transnacionais, contra o modelo de sociedade sustentado pela maioria dos eleitores. Cada eleição para as classes abastadas, de dois em dois anos, é motivo para se ressuscitar fantasmas, apelar às mentiras, alimentar factoides, semear a discórdia e o medo entre os brasileiros mais suscetíveis.
 
Mas não é necessário um microscópio para identificar rapidamente que, seja na estrela do PT ou na bandeira peemedebista, há fissuras consideráveis na formulação de um governo refratário aos desmandos, à serventia dos interesses daqueles mesmos conservadores que, se puderem, não deixam pedra sobre pedra no terreno construído, a duras penas, por homens e mulheres que deram suas vidas em nome de um Brasil mais digno, justo e igualitário. Motivados por uma aversão ao desconhecido, muitos simpatizantes destas legendas aferroam-se aos pilares do discurso fácil, no qual palavras como liberdade, igualdade e fraternidade servem apenas para embalar as cantigas de ode ao mercado, à iniciativa privada e à intervenção divina nos negócios de Estado.
 
Não é preciso cavoucar muito para descobrir que 80% de todos os recursos destinados à propaganda de governos, tribunais e casas legislativas, de todo o país, escoam para dentro dos cofres de meia-dúzia de empresas de comunicação, co-irmãs do sistema de dominação montado ao longo dos ‘anos de chumbo’. Mesmo as concessões para rodovias, aeroportos e prospecção de petróleo, aplaudidos pela mídia nativa de ultradireita como vitória do livre mercado e aceitas por segmentos dos partidos de tendência socialista como um mal necessário no momento, não passam de uma válvula de escape à pressão dos grandes grupos econômicos, em uma clara tentativa de, novamente, deter a revolução iniciada ainda no governo do presidente João Goulart.
 
Jango, enterrado agora com as devidas cerimônias militares a que sempre teve direito, precisará ser cultuado por mais alguns longos anos até que as reformas de base saiam do papel. No ritmo em que anda o cortejo, vai demorar a chegada de uma reforma agrária socialista, da nacionalização do solo brasileiro, do rompimento com a propriedade privada que não atenda às necessidades sociais, à educação pública de qualidade e o fim de todas as demais fontes que abastecem as castas golpistas. Com o apoio tácito de quem deveria combatê-los, o lumpesinato de direita afia seus dentes seja na equipe de governo da presidenta Dilma, no Legislativo e, principalmente, nas mais altas esferas do Judiciário.
 
O pragmatismo petista e de seus aliados, no PMDB e alhures, que ditam o ritmo das transformações sociais ora em curso no país, segundo analistas tão pragmáticos quanto, serve como uma espécie de “algodão entre os cristais”. A política de agradar a todos, tão bem desempenhada nos três estágios pós-neoliberais, desde o fim da era FHC, evitaria tanto um novo golpe de direita quanto a famosa “revolução comunista”, que enche de terror a velhinha carola das Minas Gerais. O conceito, que agrupa na mesma trincheira moderados da esquerda e conservadores envergonhados, no entanto, já deu mostras de fadiga nas manifestações que varreram as ruas do país em meados deste ano que termina.
 
O ambiente caótico, formado da noite para o dia, sacudiu tanto as estruturas do velho conformismo matuto – que prefere o passo lento das transformações à velocidade revolucionária – quanto do conservadorismo mais indecente. Este último, com o apoio indistinto de manifestantes alienados, ditos ‘coxinhas’, viu nos movimentos de base uma chance de tentar aplicar o golpe da vez. Não conseguiu, claro, mas novamente alimentou fantasmas, apelou às mentiras, criou factoides e semeou o medo e a discórdia no seio da sociedade brasileira.
 
Em meio à barafunda, no entanto, pode-se notar o amadurecimento dos eleitores que, nas urnas, tendem a sufragar mais uma vez a bandeira do comunismo dentre as demais no campo das esquerdas, como o farol em meio à névoa da ignorância e da vilania. Apesar das filigranas que dividem as forças comunistas no Brasil, um número cada vez maior de brasileiros passa a conhecer e apoiar as lutas que começaram muito antes dos protestos de Junho. Reconhecem na força de vontade de comunistas históricos como Nelson Mandela, Che Guevara, Carlos Marighela e Carlos Lamarca, para não estender a lista, o valor da causa pela qual deram suas vidas.
 
Será das urnas que sairá, no ano que vem, um novo capítulo da luta de resistência que segue adiante na América Latina, contra a dominação dos donos do capital sobre os trabalhadores. Vencer as forças reacionárias do velho sistema é a meta que precisa ser atingida para evitar que o obscurantismo e o retrocesso reassumam o controle da nação. Não é hora, portanto, de se perder em discussões estéreis sobre o tom de vermelho que veste a presidenta Dilma, mas de garantir que ela permaneça onde está, por mais quatro anos.
 
Se Dilma anda devagar, melhor convencê-la a caminhar mais depressa, rumo ao comunismo, do que ver o país submergir sob o peso da estupidez capitalista.
Esta, sim, é a diferença entre avançar e retroceder.
 
 *Gilberto de Souza é jornalista, editor-chefe do Correio do Brasil.
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário