Por Ana Cristina Santos do Grabois.org
A narrativa impressiona, emociona, revolta. Na busca por justiça os representantes dos camponeses torturados na Guerrilha do Araguaia repetem incansavelmente, nos mais diversos fóruns, as histórias de desrespeito, tortura e negligência. Na tarde desta terça-feira (7), a luta dos torturados no Araguaia ganhou um importante aliado: a Ordem dos Advogados do Brasil.
Foto: Eugenio Novaes
As indenizações foram aprovadas pelos danos, sobretudo materiais, sofridos durante as quatro campanhas do Exército que dizimaram a guerrilha comandada pelo PCdoB no Araguaia. Esses camponeses comprovaram que os poucos bens que possuíam como plantações, criações, equipamentos agrícolas, foram destruídos pelas forças de segurança à época.
Os relatos
O ex-deputado federal Aldo Arantes (PCdoB/GO), membro do Grupo de Trabalho Araguaia, do Ministério da Defesa, também participou da reunião e ajudou a mediar o debate. Arantes abriu o encontro e introduziu o tema, destacando que a pauta deveria abordar a questão jurídica, sem deixar de lado os problemas concretos que os atingidos no Araguaia sofreram e sofrem em suas vidas.
José Moraes, ou Zé da Onça como é mais conhecido o presidente da ATGA, expôs a situação de violência moral a que estão submetidos os camponeses anistiados. Ele explicou que as operações no Araguaia duraram até 1975 e lembrou que quando os militares chegavam usavam de extrema violência para obrigar as pessoas a dizer onde estavam os guerrilheiros, mesmo que não soubessem nenhuma informação. Os guias também eram obrigados a mostrar os locais. O clima era de medo e insegurança. As casas e objetos eram queimados, as pessoas mutiladas, mortas ou seriamente machucadas.
Zé da Onça destacou que os camponeses vitimados pela ação dos militares estão doentes e morrendo sem assistência. Eles precisam dos recursos da anistia para ter, pelo menos, tratamento digno e apropriado. Ele se pergunta qual o motivo que impede os autores da ação de suspensão da anistia de conhecer in loco a realidade da região. “Porque que os advogados do Bolsonaro não foram até o Araguaia para ver a realidade, as pessoas queimadas, as mãos calejadas antes de entrar com esse processo?”
Sezostrys Alves da Costa, tesoureiro da ATGA, ajudou a reconstituir a história da luta dos camponeses e destacou o papel da Comissão da Anistia, que foi até a região para ouvir os relatos daquela população. Ele falou sobre a sensação de segurança e a esperança que estas ações trouxeram às vítimas e ressaltou a seriedade do trabalho desenvolvido pelo grupo.
Militares
Raimundo Melo, da Associação dos Ex-combatentes do Araguaia, também fez depoimento sobre a ação militar na época e a dificuldade de organização dos ex-combatentes devido a repressão e tentativas de intimidação que ainda acontecem. Ele relatou casos de estupro de crianças e idosas, de extermínio de agricultores e casos de prisão e tortura.
Um caso em particular chamou a atenção dos presentes: o relato de tortura de um camponês no qual passaram açúcar em todo o corpo e jogaram em um formigueiro. A vítima em questão era o pai de José Moraes, presidente da ATGA.
Raimundo explicou que militares eram treinados para exterminar as pessoas e que frequentemente sofriam castigos físicos, destacando que tem conhecimento de pelo menos 13 militares que morreram em conseqüência de tortura. “Eles treinavam na gente e depois praticavam no pessoal de lá e do PCdoB”, afirmou.
Apoio da OAB
O presidente da OAB ouviu todos os relatos com bastante atenção e opinou que seria um passo importante para a humanização da justiça se o juiz pudesse fazer uma vistoria no local, conhecer as pessoas envolvidas no processo e ouvir os seus depoimentos.
Ophir Cavalcante disse que a OAB estudará providências e por meio de sua Comissão Nacional de Direitos Humanos deverá aprofundar as discussões e investigações em torno dessas revelações. De imediato o assunto será incluído na pauta da entidade e os veículos de comunicação darão atenção especial ao tema como forma de ampliar a divulgação da causa.
“Eu gostaria de tranqüilizar o povo do Araguaia e dizer que a OAB tem responsabilidade histórica com esse país. Por isso, dentro das nossas possibilidades, ajudaremos nesse processo. Não podemos viver com essa violência que se tenta exercer sobre o povo desse país”, assegurou Cavalcante.
Presenças
Também participaram da reunião o secretário-geral do Conselho Federal da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho; o membro honorário vitalício da entidade, Cezar Britto; o presidente da OAB do Rio de Janeiro, Wadih Damous; Pedro de Oliveira, da Fundação Maurício Grabois; Milton Alves, do Comitê Central do PCdoB, e os advogados da ATGA Cláudio Moraes e Ronaldo Fonteles.
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