sábado, 18 de agosto de 2012

Atenção, rolou propina no processo licitatório do VLT de Cuiabá




Vinícius Segalla 
Do UOL, em Cuiabá (MT) e em São Paulo*

A licitação para definir o consórcio construtor do VLT de Cuiabá, atualmente orçado em R$ 1,47 bilhão, tinha o seu vencedor conhecido pelo menos um mês antes da entrega das propostas dos consórcios concorrentes e da abertura dos envelopes.

No dia 18 de abril deste ano, uma mensagem cifrada publicada no jornal Diário de Cuiabá revelou que o Consórcio VLT Cuiabá, formado pelas empresas Santa Bárbara, CR Almeida, CAF Brasil Indústria e Comércio, Magna Engenharia Ltda e Astep Engenharia Ltda, sairia vencedor do certame. O MP-MT (Ministério Público de Mato Grosso) foi informado sobre a mensagem e como decifrá-la.  A abertura dos envelopes foi realizada no dia 15 de maio, confirmando o resultado.

UOL Esporte também havia tomado conhecimento da informação semanas antes do evento. Em 22 de abril, Rowles Magalhães Pereira da Silva, assessor especial do vice-governador do Estado de Mato Grosso, adiantou que o consórcio VLT Cuiabá venceria a licitação. Rowles afirma ainda que integrantes do governo estadual receberam uma propina da ordem de R$ 80 milhões para viabilizar o negócio, e que o acerto para determinar o vencedor fora articulado entre os três consórcios primeiros colocados na concorrência.

Na última segunda-feira, o MP-MT informou à reportagem que recebera a informação de que a licitação havia sido dirigida. Um denunciante, que tem seu nome mantido sob sigilo pelos promotores, revelou a publicação de uma mensagem cifrada na sessão de classificados do jornal Diário de Cuiabá no dia 18 de abril. O anúncio informava: “Vende-se terreno. Na avenida da Feb, entre as ruas Carlos Roberto Almeida e Santa Bárbara. Em frente ao local vai passar o VLT. CAF. (65) 9001-2012”

A avenida da Feb é uma das principais vias por onde passará o VLT, na cidade de Várzea Grande, na região metropolitana de Cuiabá. Já as ruas Carlos Roberto Almeida e Santa Bárbara não existem, e seriam uma indicação das duas empreiteiras que integram o consórcio vencedor (CR Almeida e Santa Bárbara). A palavra CAF, que não tem função nenhuma no anúncio publicado, é o nome da empresa construtora de trens que integra o consórcio vencedor. Por fim, o número de celular, que também não existe, é um indicativo do número da licitação, sem o algarismo nove: 001-2012.

O MP-MT afirma estar investigando o caso, junto com outros elementos que indicariam o possível arranjo entre os concorrentes da licitação.

O assessor especial do governo e a montagem da licitação


Antes de ser nomeado assessor especial do governo, Rowles Magalhães Pereira da Silva representava o fundo de investimentos Infinity, que doou ao Estado de Mato Grosso o estudo de viabilidade utilizado para montar o edital de licitação da obra.

O Infinity adquiriu o estudo junto à empresa estatal portuguesa Ferconsult, que projeta e executa obras de transporte sobre trilhos. Rowles afirma ter sido traído por membros do governo de Mato Grosso, pois teria feito a doação do estudo sob a condição de que a estatal portuguesa participasse da construção, o que acabou por não acontecer.

O documento, intitulado “projeto básico de viabilidade técnica e financeira”, projetava uma obra inicialmente orçada em R$ 700 milhões. Considerando este valor, o estudo doado por Rowles ao governo de Mato Grosso custa cerca de R$ 14 milhões, ou 2% do valor total do empreendimento, custo médio deste tipo de documento técnico, de acordo com o Sinaenco (Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva).

O acerto entre Infinity, Ferconsult e governo de Mato Grosso teria sido costurado em uma viagem ocorrida em maio de 2011, quase um ano antes de Rowles ser nomeado assessor especial do governo. Uma comitiva do governo de Mato Grosso foi à cidade do Porto (Portugal) conhecer o sistema de VLT do município. O governador Silval Barbosa e o presidente da Assembleia Legislativa de Mato Grosso, deputado José Riva (PSD), eram alguns dos membros da comitiva, que também incluiu Rowles Magalhães Pereira da Silva, então representante do Infinity. Cerca de um mês depois, no dia 17 de junho, o fundo de investimentos doou o estudo de R$ 14 milhões ao governo de Mato Grosso.  

De acordo com o assessor especial do vice-governador, o combinado era que a obra fosse executada por meio de uma PPP (parceria público-privada), em que a estatal portuguesa faria parte do grupo construtor. O que ocorreu, porém, foi um processo de licitação, cujo edital fora publicado no dia 6 de março deste ano, em que a Ferconsult não participou.

Segundo Rowles, como o estudo de viabilidade da estatal fora utilizado no edital, sua participação no certame seria contestada na Justiça pelos concorrentes, que poderiam alegar que a empresa atuava de posse de informações privilegiadas, já que o projeto colocado sob licitação era montado com base em material produzido pela Ferconsult.

Contrariado em seu interesse principal, Rowles passou a fazer lobby para que o consórcio liderado pela empreiteira Mendes Júnior saísse vitorioso do processo. Enquanto o processo licitatório corria, Rowles foi nomeado, no dia 2 de abril, “para exercer o cargo em comissão de Direção Geral e Assessoramento, nível DGA-4, de Assessor Especial II, do gabinete do Vice Governador”.

No dia 22 de abril de 2012, após, segundo afirma, ter perdido sua segunda batalha interna no governo, Rowles procurou  o UOL Esporte e afirmou que o consórcio VLT Cuiabá seria o vencedor da licitação. No dia seguinte, o blog “Prosa e Política”, da jornalista Adriana Vandoni, publicou a informação, fornecida pela reportagem do portal. No dia 22 de maio deste ano, o resultado final da concorrência, divulgado pelo governo de Mato Grosso uma semana após a abertura dos envelopes, confirmou a informação de Rowles.

Mesmo depois da conclusão do processo licitatório, Rowles continuou pressionando o Estado para que atendesse aos interesses do fundo de investimentos e da empresa portuguesa, ameaçando o secretário estadual da Secretaria Extraordinária da Copa do Mundo, Maurício Guimarães, de revelar a suposta fraude na licitação.

“Eu tive uma conversa com o secretário na terça ou na segunda-feira (9 ou 10 de junho deste ano). Eu falei, ‘bicho, não é para você tentar, você se vira, você vai ter que ajeitar. Não ajeitou, é pau, o pau come’”, teria dito Rowles ao secretário, pressionando por uma compensação à Ferconsult pelo estudo de viabilidade fornecido.

Em entrevista ao UOL Esporte, o secretário Maurício Guimarães negou qualquer pagamento de propina ou fraude na licitação. A entrevista aconteceu em 20 de julho deste ano, quando o secretário foi informado sobre as denúncias de Rowles. Mesmo assim, o assessor especial é mantido no governo desde então.

“A empresa portuguesa (Ferconsult) fez o estudo de viabilidade e, através do Infinity, que tinha interesse em trabalhar com PPP na obra, fez ao Estado a doação”, afirmou Guimarães. “Mas o Estado acabou por definir que faria por si só o processo, definimos que o Estado iria executar a obra”.

Apesar de dizer que o Estado recebeu o estudo de viabilidade do Infinity sem ter jamais negociado com a Ferconsult, Guimarães admite que membros da diretoria da Ferconsult foram de Portugal a Cuiabá cobrar uma posição do governo mato-grossense.

“Eles (diretoria da Ferconsult) dizem que nós disponibilizamos o estudo deles no edital e, por isso, eles não puderam participar do processo licitatório, mas há controvérsia quanto a isso. O estudo foi doado à Secopa, se eles entenderam que por isso eles não poderiam participar do processo, eu lamento”.
Já quanto às tratativas com o assessor especial do governo Rowles Magalhães Pereira da Silva sobre interesses do fundo de investimento e da Ferconsult, o secretário se mostra confuso quanto aos fatos, conforme se nota por meio da entrevista gravada de Guimarães ao UOL Esporte.

Leia entrevista completa aqui

O blog continua questionando a prefeitura de São Luís: Cadê o edital? Quais as empresas que participarão ou participaram do certame licitatório das obras civis? Sabemos que o VLT (Trem) será exposto no centro da cidade a partir do dia 1º de setembro de 2012. Como foi a forma da compra desse trem? Quanto custou? Comprado de quem? Quanto já foi gasto com o projeto? O recurso é proveniente do Governo Federal, Estadual ou Municipal?

Vamos ficar atentos!

* Colaboraram Adriana Vandoni, especial para o UOL, em Cuiabá, e Vinícius Konchinski, do UOL, no Rio de Janeiro
Fonte: Uol Esporte

Nenhum comentário:

Postar um comentário