quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Negro, nordestino, 30 anos: perfil do trabalhador em regime forçado no Brasil


Eles têm em média 32 anos, mas alguns aparentam "idade bem superior à que tinham em decorrência do trabalho duro e extenuante no campo", aponta relatório divulgado nesta terça-feira (25) pelo escritório brasileiro da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre o trabalho escravo rural.
Desde 1995, mais de 40 mil pessoas foram resgatadas de condição análoga à escravidão.

"Invariavelmente sua aparência nas diferentes fazendas era semelhante: roupas e calçados rotos, mãos calejadas, pele queimada do sol, dentes não cuidados", diz o relatório a respeito dos trabalhadores entrevistados. "O trabalho forçado constitui a mais clara antítese do trabalho decente”, afirma a diretora do escritório, Laís Abramo.

Segundo a pesquisa, 53% dos trabalhadores tinham menos de 30 anos, o que é considerado compreensível em razão de o trabalho exigir uso de força física. Mesmo assim, trabalhadores com 50 anos ou mais correspondiam a 7,4%, dado considerado surpreendente pela OIT, "tendo em vista se tratar de trabalho exaurido e pesado".

O levantamento detecta o que se chamou de outra face perversa da exploração: o trabalho infantil. "Praticamente todos os entrevistados na pesquisa de campo (92,6%) iniciaram sua vida profissional antes dos 16 anos. A idade média em que começaram a trabalhar é de 11,4 anos, sendo que aproximadamente 40% iniciaram antes desta idade", aponta a pesquisa. Quase 70% trabalhavam no âmbito familiar, enquanto os demais "já trabalhavam para um empregador, juntamente com a família (10%) ou diretamente para um patrão (20,6%)".

Os negros correspondiam a 80% do total. Na pesquisa, "negros" são os que se declararam pretos ou pardos. "Chama a atenção a proporção de pretos entre os trabalhadores pesquisados (18,2%), um percentual 2,5 vezes superior ao encontrado na população brasileira (6,9%)", diz a OIT.

Segundo o coordenador do Projeto de Combate ao Trabalho Escravo da entidade, Luiz Antonio Machado, as informações obtidas na pesquisa de campo vão ao encontro do banco de dados do Ministério do Trabalho e Emprego, que em 1995 criou o Grupo Especial de Fiscalização Móvel.

Ele chama a atenção para a vulnerabilidade social como principal fator de exposição à situação de trabalho degradante. "A pobreza é um catalisador desse problema social. É preciso garantir assistência às vítimas, para diminuir a vulnerabilidade, porque senão acabam voltando”. Entre os trabalhadores entrevistados, diz a OIT, quase 60% já haviam passado anteriormente pela situação de trabalho escravo.

A renda média declarada pelos entrevistados foi de 1,3 salário mínimo - 40,5% disseram receber até um mínimo e 44,8%, de um a dois. Com grande diferença regional: 55,5% dos trabalhadores do Nordeste disseram receber até um salário mínimo  por mês, ante 21,5% do Norte e Centro-Oeste. E 77,6% dos trabalhadores nasceram na região Nordeste - 41,2% dos entrevistados eram naturais do Maranhão, bem à frente dos nascidos na Bahia (18,2%), na Paraíba (8,2%) e Piauí, Tocantins, Mato Grosso e Paraná (5% cada).
A pesquisa foi realizada por pesquisadores que colaboram com o Grupo de Estudo e Pesquisa Trabalho Escravo Contemporâneo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (GPTEC/UFRJ), de 2007 a 2009 e de 2010 até agora, com supervisão da OIT.
Também foram entrevistados empregadores. Quase todos se manifestaram contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 438, de combate ao trabalho escravo. "Se vier a acontecer isso vai ser uma revolta muito grande. Tem que ser bem analisado. É tão fácil vir lei de lá de cima para a gente engolir", disse um deles.

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