Recentemente passei quase três semanas no Pará, viajando pelo estado.
Notei, nas bancas de Belém, a presença sempre destacada do Jornal
Pessoal, do repórter Lúcio Flávio Pinto, que também tem versão digital.
Comprei o dossiê que ele preparou sobre a Companhia Vale do Rio Doce, sobre o qual o Viomundo tinha publicado um texto, reproduzido da Adital.
Dias depois, tive um breve encontro com o repórter na praça da
República, onde fica o lindíssimo Teatro da Paz, herança dos tempos do
ciclo da borracha.
Há, é importante frisar, um paralelo entre o ciclo da borracha e o
ciclo do minério de ferro, que sai de Carajás, no sul do Pará, ao ritmo
de 100 milhões de toneladas por ano: nenhum deles enriqueceu o estado.
Em nossa conversa, Lúcio Flávio confessou que sentiu um nó no peito
toda vez que viu o trem carregado de minério partindo de Carajás em
direção ao porto da Ponta da Madeira, no Maranhão, onde é embarcado para
exportação.
Ele se sente tão indignado com o assunto que, além do dossiê, lançou um blog, no qual pergunta: a Vale é mesmo nossa?
O que mais deixa o repórter preocupado não é o fato de que a Vale
engorda, enquanto o Pará emagrece. Nem o fato de que as ações
preferenciais da empresa, aquelas que têm prioridade para receber
dividendos, são controladas majoritariamente por norte-americanos. Ou
seja, um novaiorquino dono de ações da Vale ganha muito mais com o
minério de Carajás que o paraense que vive em Marabá ou Parauapebas.
O que deixa o jornalista indignado é o ritmo das exportações de
minério de ferro de Carajás, nas palavras de Lúcio Flávio “o melhor do
mundo, com o dobro de teor de hematita que o minério da Austrália”,
outro importante fornecedor da China e do Japão — que compram 80% das
exportações brasileiras.
Quando a exploração de Carajás começou, em 1984, a previsão é de que a
mina duraria 400 anos. Ao ritmo de 100 milhões de toneladas por ano,
que deve crescer para 230 milhões em 2016, a previsão agora é de que
Carajás dure mais 80 anos, diz Lúcio Flávio. “Um crime de lesa Pátria”,
“um crime que viola a soberania do país”, afirma.
O jornalista traça um paralelo com a exportação de manganês da Serra
do Navio, no Amapá. Durante 50 anos, os Estados Unidos importaram 1
milhão de toneladas anuais do Brasil. E até hoje guardam estoques
estratégicos do minério brasileiro, de altíssima qualidade, que misturam
ao minério de baixa qualidade para garantir a siderurgia local,
dependente em 90% das importações.
A mina do Amapá se esgotou em 2002. Qual foi o legado principal para o
estado? Quando se descobriu que o manganês fino tinha uso industrial,
foi implantada no Amapá uma usina de pelotização, que usou grandes
quantidades de arsênio no processo. O arsênio hoje contamina o porto de Santana em doses muito superiores às recomendadas pela saúde pública.
Para Lúcio Flávio, os chineses estocam o minério de ferro brasileiro
de forma estratégica, além de transformá-lo em bens de imenso valor
agregado.
No dossiê, pergunta: “Temos algum controle sobre o processo de
formação de preços? Quem estabelece a escala da produção, que está
duplicando, para incríveis 230 milhões de toneladas, em 2015, a atual
produção de Carajás? Atraídos pelo canto da sereia dos preços altos,
estamos renunciando a uma ferramenta poderosa de futuro e, com ela, à
possibilidade de agregar mais valor ao processo produtivo?”.
“A Vale é boa para si e os seus grandes clientes. Mas não — ao menos na mesma medida — para o Brasil”, conclui.
Fonte: Blog Viomundo
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