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terça-feira, 16 de junho de 2020

Governo Bolsonaro Censura Biografia De Lideranças Negras Históricas No Site Da Fundação Palmares

(FOTO: O Antropofagista)
Para Bolsonaro, dar destaque à biografia de personalidades negras importantes para a história do país é caso de censura sistêmica e não pode, em hipótese alguma, estar no site da Fundação Palmares, justamente porque a instituição federal tem como objetivo zelar por essa memória. Não há nada mais eficaz para o conceito de um racista que suprimir qualquer forma de memória da história do país em que haja papel de destaque de um negro.

Funcionários da Fundação e pesquisadores acusam Sergio Camargo, o chefe do órgão, escolhido a dedo por Bolsonaro para negar a importância dessas figuras históricas que se projetaram na história do país pelas enormes contribuições que deram para o seu desenvolvimento.

Por isso, desde que Camargo assumiu a presidência da Fundação, com a nítida intenção de destruí-la para tirar sua importância do cenário cultural brasileiro, a mando dos ímpetos racistas de Bolsonaro, esse tipo de atitude vem acontecendo de forma coordenada.

Lógico que Camargo é um tarefeiro disposto a cumprir a agenda racista de Bolsonaro. Por isso ordenou que a página fosse apagada do site da Fundação.

O site na internet mostrava um lindo mosaico com fotografias e nomes de diversas personalidades negras e, através dele, tinha-se acesso a vários artigos sobre a vida e obra de mulheres e homens negros que marcaram a história do país, como Zumbi dos Palmares, considerado o principal líder negro do Brasil.

Por isso Camargo, usado como boneco de ventríloquo por Bolsonaro, tem atacado tão fortemente a biografia de Zumbi para reescrevê-la a modo e gosto de Bolsonaro.

Essa sordidez racista que Bolsonaro, ao contrário de esconder, fez grandes esforços para promover na construção de sua candidatura, vide seu discurso fascista contra quilombolas proferido na Hebraica, é parte da personalidade indissociável de Bolsonaro. Ele é racista e faz questão de dobrar a aposta em cada feição, em cada fala e em cada atitude.

Claro que ele não tem o menor medo do ridículo quando demoniza a figura do Zumbi e exalta a coroa imperial como o ponto alto da escravatura no Brasil.

Para Bolsonaro, o importante é apagar a história de qualquer liderança negra, mostrando que seu racismo é carregado de ódio. Mas como o racismo no Brasil pode lhe render uma cadeia, ele usa Sergio Camargo, que é negro e que se presta a esse papel ultrajante para declarar guerra a tudo o que vem promover a história de construção dos negros no Brasil.

E fará isso na Fundação Palmares porque o principal objetivo de Bolsonaro é destruí-la, como quem estivesse destruindo um quilombo que ele odeia, como já declarou.

quarta-feira, 27 de novembro de 2019

“Negro de esquerda é escravo”, diz novo presidente da Fundação Palmares


Sergio Camargo, presidente da Fundação Palmares
Por Erick Mota*

O secretário especial de Cultura, Roberto Alvin, está promovendo mudanças nas principais pastas sob sua coordenação. Entre elas está a troca da direção da Fundação Palmares, responsável por resguardar e fomentar a cultura afro-brasileira. Saiu o presidente Vanderlei Lourenço, e foi nomeado para o lugar Sérgio Nascimento de Camargo. O novo mandatário da pasta tem um extenso histórico de embates com negros nas redes sociais. Dentre as polêmicas ditas por ele está uma publicação que afirma que "negro de esquerda é burro, é escravo".

O novo presidente da Fundação criada para resguardar a cultura negra no país, já criticou rap, funk, capoeira e seus adeptos.

Com uma postura semelhante à do ministro da Educação, Abraham Weintraub, Sérgio promete bloquear os "esquerdistas" do seu Facebook. "Reitero: todo esquerdista será bloqueado; todo comentário de esquerdista será excluído. Não perca seu tempo aqui. Não sirvo capim!", disse o novo presidente da Fundação Palmares.

Recentemente, dezenas de marcas de móveis lançaram uma campanha para não se usar mais o nome "criado-mudo" em seus móveis, pois, segundo historiadores, este nome remete aos negros que deveriam ficar ao lado de seus patrões, segurando seus objetos, sempre mudos. Mas para Sérgio isto é o cerceamento da liberdade de expressão. "Nossa liberdade de expressão não pode ser ditada pelos que enfiam crucifixos no ânus, cagam na rua e fazem criança tocar em peladão no museu.

Ignorem listas de palavras vetadas pela esquerda", disse o novo presidente da entidade criada, também, para combater o racismo.

Para Sergio, quem escravizou os negros, foram os próprios negros e por isso, não deve haver reparação histórica. "Negros sempre ESCRAVIZARAM negros. Escravizam até hoje na África. Quer reparação histórica? Vá cobrar no Congo! Boa sorte!", disse.




*Erick Mota - Jornalista formado pelo Centro Universitário UniOpet. Trabalhou na Gazeta do Povo, Em Cartaz, filadas da TV Band e Record no Paraná, além da TV Evangelizar. Foi freelancer no Correio Braziliense







sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Evangélicos de escola de música de universidade do Rio se recusam a cantar Villa-Lobos



Músicas de Villa-Lobos são
executadas por orquestras
 internacionais, mas enfrentam
 resistência no Brasil
 por motivo religioso

Pode parecer absurdo que alunos de música de uma universidade do país se recusem a tocar ou cantar músicas do genial compositor Heitor Villa-Lobos (1887-1959), mas isso está ocorrendo com frequência.


Andrea Adour, professora de Canto da Escola de Música da UFRJ, informa que alunos evangélicos que se recusam a cantar “Xango” [reprodução abaixo], de Villa-Lobos, porque acharem que se trata de uma reverência a um demônio de religiões de origem africanas.


A estupidez se manifesta com outros compositores, como Guerra Peixe (autor de "Toadas de Xangô"), Francisco Mignone (“Cânticos de Obaluayê”) e Waldemar Henrique (“Abalogun").

A professora explica aos estudantes que a universidade é um espaço laico e, portanto, de diversidade cultural e que, ali, a música está vinculada à arte e não a qualquer prática religiosa.

Além do mais, é impossível estudar música do Brasil sem falar em Villa-Lobos e até entender as origens da cultura popular.

Nem sempre a professora convence os evangélicos, e alguns deles desistem do curso ou trancam matrícula.

Andrea é coordenadora do Africanias, um grupo de pesquisa sobre as influências negra e indígena no repertório brasileiro.

Ela diz que a recusa de alunos ao estudo de músicas com referência a religiões de afrodescendentes é um comportamento recente, mas em ascensão.

Valéria Matos, professora de Regência do Coral da UFRJ confirma: “É comum alunos de formação religiosa mais fechada questionarem, se recusarem a cantar, quando apresentamos alguma obra que usa termos de origem afro, referindo-se a entidades como Oxalá, Oxum”.

Para ela, o que está ocorrendo na escola de música é reflexo do atraso cultural que o Brasil vive no momento, o que serve de incentivo à intolerância religiosa.

Por isso mesmo, segundo ela, aumentou a responsabilidade da universidade em ensinar a diversidade aos estudantes.

Nem todos os estudantes evangélicos estão atrelados ao retrocesso cultural.

Paulo Maria, da Escola de Música, por exemplo, denuncia a existência de um racismo cultural.

“Cantar essas músicas não afeta minha religiosidade. Quando canto peças que se referem a religiões afrobrasileiras, canto como artista. Mas essa situação faz parte da História brasileira. O negro foi feito escravo, a cultura afro foi jogada de lado pelos europeus. Nossa formação histórica é essa”, diz.




segunda-feira, 14 de maio de 2018

Feminismo não é Vitimismo!


Texto de *Mariana Selister Gomes para as Blogueiras Feministas.

Nos últimos dias, assisti ao filme “Negação” (Mick Jackson, 2016), o qual baseia-se na história real da disputa judicial entre a historiadora Deborah Lipstadt e o escritor David Irving, quando este a acusa de difamação, por ela denunciá-lo publicamente como um negador do holocausto. O filme me emocionou, tanto pela história que registra, quanto por perceber o quanto ainda hoje precisamos lutar contra os negacionistas – sejam eles negadores do holocausto, do racismo ou do machismo.
Na Universidade Federal de Santa Maria, recentemente, dois grupos entraram nesta luta, ao enunciar o slogan: “Feminismo não é Vitimismo”. Ambos buscaram denunciar a negação do machismo, que se oculta na alcunha de “vitimista” dada ao feminismo. Um foi protagonizado pelo Coletivo “Manas RI” e outro pelo Programa “Gritos do Silêncio” da Rádio da Universidade.
Somo, aqui, meu grito: Feminismo não é Vitimismo! E explico-o nas seguintes linhas. A categoria “vitimização” ou “vitimismo” tem emergido nas universidades para se referir a luta feminista e anti-racista. De certa forma, esta é uma versão acadêmica da “categoria” “mimimi”, difundida por grupos conservadores nas redes sociais. Por seu turno, legitimamente, os movimentos feministas (entendidos aqui no plural, abarcando mulheres negras, trans, lésbicas…) reagem, por toda a parte, a esta categoria, entrando em uma disputa simbólica para demonstrar que sua luta não é mimimi/vitimismo – como aconteceu na UFSM.
Ressalto que o conhecimento acadêmico não é totalmente neutro e insere-se nestas disputas de saber-poder – como demonstraram teóricas e metodólogas feministas (como Sandra Harding e Donna Haraway), teóricos decoloniais (como Aníbal Quijano e Edgardo Lander) e filósofos pós-estruturalistas (como Michel Foucault). Sendo assim, a objetividade é garantida pelo debate de ideias de forma transparente, no qual é preciso responder a duas questões: 1. Para que(m) serve o conhecimento produzido? 2. Quem está produzindo esse conhecimento?
Neste sentido, podemos questionar quem está produzindo um discurso acadêmico sobre “vitimização/mimimi” e por que o está produzindo – sendo garantida a liberdade científica e a liberdade de expressão em produzir este conhecimento, desde que estejamos alertas para possíveis abusos destas liberdades, os quais ocorrem quando esta é usada para propagar discursos de ódio (como no caso relatado no filme mencionado anteriormente).
No que tange ao discurso acadêmico sobre “vitimismo”, tomo a liberdade de questioná-lo, segundo diferentes pontos de vista, resumidos a seguir:
1) A partir da Sociologia: desde seus primórdios como Ciência, com as proposições de Augusto Comte e de Émile Durkheim, no século XIX, a Sociologia ancora-se em evidências empíricas para análise de fatos sociais. Em que pese todos os debates na área ao longo dos séculos, a demonstração concreta da realidade social continua a ser fundamental. Neste sentido, diversos dados estatísticos constatam o fato de que as mulheres são vitimadas na sociedade atual. Cito, por exemplo, os dados do Datafolha e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, divulgados pela grande mídia, os quais demonstram que a cada 11 minutos uma mulher é estuprada no Brasil, e a cada hora, 503 mulheres são vítimas de agressão física.
2) A partir da Ciência Política: teóricos/as como Nancy Fraser e Axel Honneth tem demonstrado que, a partir de meados do século XX, uma nova pauta política emerge – a luta por Reconhecimento. Grupos sociais historicamente marginalizados (como mulheres e negros) deixam de concentrar suas lutas em conquistas objetivas, para abordar, também, uma pauta subjetiva, lutando pelo seu reconhecimento social e pelo reconhecimento dos problemas sociais, como o racismo e o sexismo. Neste âmbito, torna-se importante disputar e legitimar a categoria vítima, para que a sociedade reconheça o problema e adote medidas reparatórias.
3) A partir da Antropologia: esta área das Ciências Sociais traz à tona a importância de a ciência olhar para o ponto de vista do “nativo”. Ou seja, para a Antropologia, os/as agentes sociais precisam ser ouvidos e seus sentidos precisam ser evidenciados. Desta forma, a categoria vítima, entendida como categoria nativa, deve ser analisada pela importância que ela tem para àqueles/as que a enunciam e reivindicam. Ou seja, se as mulheres estão anunciando-se vítimas, a Ciência deve ouvi-las e compreender o sentido conferido por elas. Ainda dentro da Antropologia, há quem questione o excesso de foco na categoria vítima, bem como, o pouco destaque dado a agência das mulheres. Ainda assim, não é negada a estrutura social que vitima as mulheres.
4) A partir da Filosofia: seguindo uma linha de pensamento sob influência de Hannah Arendt, poder-se-ia refletir que a legitimação social da categoria vítima por determinado grupo social não pode (em um sentido abstrato relacionado com valores universais) servir como justificativa para determinados tipos de ação. Neste sentido, seria possível questionar algumas ações de certos grupos dentro do feminismo. Ainda assim, isto não se configuraria em deslegitimação da categoria vítima, tampouco, em legitimação da categoria “vitimismo”, mas em problematização sobre os usos desta categoria tendo em vista algumas consequências, para outros grupos e para o próprio movimento. Seguindo outra linha filosófica, ancorada na problematização nos contextos de produção de verdades (desde Nietzsche, passando por Foucault, Deleuze e Agamben), poder-se-ia refletir que a “vítima” não existe de maneira ontológica. A “vítima” seria uma construção social e histórica. Contudo essa construção está ancorada em hierarquias de poder. Isto significa, sobretudo em Foucault, que estão em jogo as disputas pelas verdades, as quais tem implicações concretas. Dizer que algum grupo é ou não vítima não significa considerar um grupo vítima a-historicamente, significa compreender o jogo de forças sociais no contexto atual que permite, ou não, a enunciação de um grupo como vítima, bem como, perceber quem ganha ou perde com essa enunciação. Ou seja, quem ganha e quem perde com a legitimação ou a deslegitimação das mulheres como vítimas? Certamente, a luta contra machismo ganha com a percepção coletiva de que o machismo existe e que este vitima as mulheres.
5) A partir da Teoria Feminista e dos Estudos de Gênero: desde a clássica Simone de Beauvoir, diferentes áreas do conhecimento científico têm demonstrado que “ser mulher” e “ser homem” são construções sociais que vão além de determinantes biológicos. Como construções sociais, os papéis de gênero, como definidos por Joan Scott, estão imersos em relações de poder (que operam nas dimensões política/institucional, material, normativa, cultural e subjetiva). Nas relações de poder (mesmo na perspectiva da microfísica foucaultiana) sempre há uma hierarquia, um exercício de subjugação do outro. Nas relações de poder de gênero, historicamente, as mulheres foram as maiores vítimas desse exercício de poder patriarcal. Destacando-se que o patriarcado é uma estrutura determinante da sociedade moderna, como demonstra Carole Pateman. Nesse campo, a categoria “vitimização/mimimi” parece impensável.
Por fim, entendo que é preciso fazer ecoar que: “Feminismo não é vitimismo!”
Autora
*Mariana Selister Gomes é Professora Adjunta do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de Santa Maria (DCS/UFSM) e Professora Colaboradora do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Sergipe (PPGS/UFS). É Pesquisadora Associada do Núcleo Interdisciplinar de Estudos sobre Mulher e Gênero da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (NIEM/UFRGS). É Doutora em Sociologia pelo Instituto Universitário de Lisboa (CIES / ISCTE-IUL), com Tese, aprovada com distinção e louvor, sobre os Imaginários Coloniais e Sexistas em torno da “Mulher Brasileira” em Portugal e as diferentes formas de Resistência e Reexistência dessas Mulheres. Na época em que viveu em Portugal, foi uma das coordenadoras do “Manifesto contra o Preconceito às Brasileiras em Portugal”. Já atuou como pesquisadora da (infelizmente extinta) Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, investigando a Violência Simbólica contra Mulheres. Teve seu ensaio sobre Imaginários e Violência contra as mulheres premiado pela ONU-MULHERES.

segunda-feira, 5 de junho de 2017

A mulher que fugiu para salvar dois bebês intersexuais de seus próprios pais


Há cinco anos, uma parteira no Quênia ajudou uma criança que tinha órgãos genitais masculinos e femininos a nascer.

O pai ordenou que ela matasse o bebê, mas, em vez disso, ela escondeu e criou a criança como se fosse dela. Dois anos depois, a mesma coisa aconteceu - e ela se viu obrigada a fugir para salvar a vida das crianças.

Como uma parteira tradicional no oeste do país africano, Zainab estava acostumada a realizar partos e trabalhou em dezenas de nascimentos. Mas nenhum como aquele de 2012.

Foi um parto difícil, mas nada com que ela não soubesse lidar. O cordão umbilical estava enrolado na cabeça da criança e ela precisou agir rapidamente, usando uma colher de madeira para desenrolá-lo.


Depois de liberar as vias respiratórias e limpar o bebê, ela cortou o cordão umbilical e viu algo que nunca tinha visto antes.

"Quando olhei para saber se era menino ou menina, eu vi uma protusão - esse bebê tinha órgãos masculinos e femininos", disse.

Em vez de dizer o que estava acostumada em momentos como aquele - "É um menino", ou "É uma menina" -, Zainab apenas entregou a criança à mãe e disse: "Aqui está seu bebê".

Quando a mãe, exausta, viu que o sexo do bebê não estava definido, ficou impressionada. O marido chegou e não teve dúvidas do que deveria ser feito.

"Ele me disse: 'Não podemos levar esse bebê para casa. Queremos que ele seja morto'. Eu disse que a criança era uma criatura de Deus e que não poderia ser morta. Mas ele insistiu. Então respondi: 'deixe o bebê comigo, eu o matarei para você'. Mas eu não o matei, eu fiquei com ele", conta Zainab.


O pai voltou a procurar Zainab várias vezes para garantir que ela tinha cumprido a promessa. Ela escondia a criança e dizia que havia matado o bebê. Mas isso não funcionou por muito tempo.

"Um ano depois, os pais ouviram dizer que o bebê estava vivo e vieram me ver. Disseram que eu jamais poderia revelar que o bebê era deles. Eu concordei e desde então crio a criança como se fosse minha."
Crenças tradicionais

Foi uma decisão rara - e arriscada.

Na comunidade de Zainab, assim como em outras no Quênia, um bebê intersexual é visto como mau presságio, que traz maldição para a família e os vizinhos. Ao adotar a criança, Zainab estava desrespeitando as crenças tradicionais e corria risco de ser responsabilizada por qualquer infortúnio.

Isso foi em 2012. Dois anos depois, Zainab ficou impressionada ao se deparar, durante mais um parto, com um segundo bebê intersexual.

Apesar de não haver estatísticas confiáveis sobre quantos quenianos são intersexuais (ou seja, nascem com os dois órgãos sexuais), os médicos acreditam que a incidência seja a mesma de outros países - aproximadamente 1,7% da população.

"Dessa vez, os pais não me pediram para matar a criança. A mãe estava sozinha e simplesmente fugiu, e me deixou com o bebê."

Mais uma vez, Zainab levou a criança para casa e a criou como parte da família. Mas o marido dela, um pescador no lago Victoria, não gostou da ideia.


"Quando íamos ao lago pescar e a pescaria era ruim, ele colocava a culpa nas crianças. Ele disse que elas tinham lançado uma praga sobre nós e sugeriu que eu entregasse as crianças para que ele pudesse afogá-las no lago. Eu disse que jamais permitiria aquilo. Ele então ficou violento e começamos a brigar o tempo todo", contou.

Zainab ficou tão preocupada com o comportamento do marido que decidiu deixá-lo e levar as crianças consigo.

"Foi uma decisão difícil porque financeiramente eu tinha uma situação confortável com meu marido, já tínhamos filhos criados e até netos. Mas ninguém consegue viver em um ambiente com tantas brigas e ameaças. Eu fui forçada a fugir."

As condições de nascimento de crianças vêm mudando no Quênia. Cada vez mais, as mulheres têm trocado os vilarejos por hospitais ao dar à luz. Mas até pouco tempo o uso de parteiras era regra, e havia uma norma tácita sobre como lidar com bebês intersexuais.

"Elas costumavam matar essas crianças", diz Seline Okiki, diretora do Ten Beloved Sisters, grupo de parteiras tradicionais do oeste do Quênia.

"Se um bebê intersexual nascia, automaticamente era visto como maldição e não poderia viver. Já era comum entre as parteiras - elas matavam as crianças e diziam às mães que o bebê havia nascido morto."

FONTE: Terra

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Brasileiro repele migrante de origem pobre e tolera o de país rico

Campanha internacional “Refugiados Sejam Bem-Vindos”
visa a promover ações de sensibilização para acolhida. DANILO RAMOS/ RBA
Sarah Fernandes
Da RBA
O preconceito de brasileiros contra refugiados sírios e africanos que chegam ao país tem mais a ver com o fato de essas pessoas virem de países pobres do que por estarem fugindo de conflitos. Essa é a opinião do diretor executivo do Instituto de Reintegração do Refugiado (Adus), Marcelo Haydu, que na noite de quarta-feira (4) participou do seminário Migração e Refúgio: O migrante como sujeito de direitos, promovido pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, na capital.
“Alguém aqui é só índio?”, questionou para as mais de 100 pessoas presentes no auditório. “Ninguém!”, emendou, ao observar que no Brasil, país formado por migrantes, está presente o preconceito contra alguns tipos de migrantes. “Na salinha do Aeroporto de Guarulhos você não vai encontrar um francês ou um americano. Lá estão apenas os africanos, que são vistos como uma ameça. Quem é a ameaça? Por que a questão do refúgio continua sendo tratada pela Polícia Federal?”
Nos últimos cinco anos, pelo menos 300 mil europeus migraram para o Brasil, a maioria para ocupar cargos altos em grandes empresas, segundo dados levantados pelo Instituto Adus. “Isso ninguém questiona. Ninguém diz que eles estão vindo para cá roubar nossos empregos, porque os europeus e os norte-americanos têm imagem atrelada a desenvolvimento, cultura e acredita-se que eles vão contribuir para o crescimento do país. Aos refugiados resta a imagem pobreza e a doença”, diz Haydu. “Os refugiados não chegam a 9 mil pessoas contra os 300 mil europeus. Por que eles não incomodam?”
O seminário marcou o lançamento no Brasil da campanha internacional Refugiados Sejam Bem-Vindos, que visa a promover ações de sensibilização na população para explicar quem são os refugiados e por que se deslocam e debater o fato de as migrações serem um dos elementos fundamentais na constituição do mundo.
A primeira ação foi convidar os participantes do seminário a escrever em uma parede sua ascendência, com o intuito de mostrar que a migração também é um elemento presente nas histórias pessoais. “Filha de português”, “neto de italianos”, “bisnetos de sírios”, foram algumas das frases que preencheram o espaço. A próxima ação será uma campanha em shoppings da capital paulista. Em uma página no Facebook serão divulgadas fotos de pessoas que aderiram à campanha, segurando uma placa escrito “bem-vindos refugiados”.
“Há um interesse econômico. Aqui no Brasil, por exemplo, todo mundo sabe onde estão os bolivianos explorados, mas eles suprem uma cadeia de mão de obra interna nossa, ganhando centavos pelas peças que fazem, trabalhando em situações insalubres e desumanas, e não se faz nada porque eles suprem uma demanda”, diz Haydu.
O Brasil tem hoje 8.400 mil pessoas refugiadas de 81 países, de acordo com o último levantamento do Comitê Nacional para os Refugiados. A maioria deles é da Síria (23%), seguida por Colômbia, Angola e República Democrática do Congo. O número de solicitação de refúgios ao governo brasileiro aumentou 22 vezes entre 2010 e 2014, de 1.165 para 25.996, de acordo dados do Ministério da Justiça, divulgados em junho. O país recebeu mais pedidos de refúgio do que a Austrália e quase a mesma quantidade do Canadá, sendo o mais solicitado da América Latina.
Atualmente, a legislação vigente para regular as migrações é o Estatuto do Estrangeiro, de 1980. No entanto, em 2013, o Senado aprovou um novo projeto de lei para regular as migrações, o PLS 288/13, que agora está na Câmara Federal, como PL 2516/15. A expectativa do relator na Comissão Especial onde o projeto tramita, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) é que ele seja votado até o final do ano.
“É o momento em que chegam muitos migrantes e também é o momento em que muitas manifestações negativas começam a aparecer. Nesse estágio ainda é possível contrapor esse comportamento por meio de uma legislação que de um tratamento mais adequado ao tema”, defende a coordenadora Adjunta da Coordenação de Políticas para Migrantes da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, Camila Baraldi.
Durante o evento, Camila avaliou que o projeto trás avanços, principalmente ao facilitar a emissão de documentos e garantir acesso aos programas sociais ao imigrantes, porém ainda preserva mecanismos considerados “contraditórios”, como a deportação e a extradição. “É uma falha básica do projeto. Se pode questionar a existência desses recursos já que se trata de uma legislação que se propõe a reconhecer as migrações e os direitos humanos dos migrantes”, disse. “É preciso garantir que essa temática seja incluída na formulação de políticas públicas e que as responsabilidades sejam distribuídas dentro do governo. Quem vai fazer a acolhida humanitária? Quem vai fazer a inclusão laboral? Quem vai garantir o acesso à moradia?”
Fonte: Sul21

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Secretaria de Estado de Igualdade Racial debate cotas raciais em Santa Inês

Na fala, o secretário Gerson Pinheiro
A Secretaria de Estado de Igualdade Racial promoveu uma audiência pública nesta quinta-feira, 23, com os movimentos sociais, quilombolas e a classe política e educacional de Santa Inês sobre o projeto defendido pela pasta que cria cotas raciais nos concursos públicos estaduais. No evento realizado no auditório da Prefeitura foi apresentado o Projeto de Lei (PL) elaborado pela Secretaria, que trata da adoção desta política afirmativa pelo Executivo Estadual, o qual foi amplamente debatido.

Segundo a professora Maria Zuila de Sousa Silva, gestora da unidade recional de educação de Santa Inês, “no Maranhão o negro ainda é excluido do processo educacional, desde a primeira infância até a universidade, portanto, criar cotas para acesso ao emprego público, significa também fortalecer a formação acadêmica da comunidade negra, dos quilombolas, para ocupar os espaços sociais e de trabalho”.

A quilombola Vânia Rafaela Borges, que também faz parte da coordenação municipal de PIR, disse ser “muito a favor das cotas, não que sejam – as cotas -  um favor do Estado para os negros, mas o símbolo de conquista da lutas pela igualdade racial, por mais espaços na sociedade, nas universidades e uma forma de vencer o preconceito e a discriminação”.

O projeto de lei foi defendido pelo secretário Gerson Pinheiro, que enfatizou: “O racismo está presente de várias formas na sociedade; desde o tratamento social diferenciado, até o acesso desigual a oportunidades de educação, renda e trabalho; isto porque não há iguais condições de formação educacional e de trabalho para os candidatos da etnia negra. E o Estado tem de reparar esse desequilíbrio através de políticas de ação afirmativa”, argumentou o secretário. “E o nosso governador Flávio Dino está muito favorável a este projeto, porque ele resgata o negro e a negra maranhenses para os colocarem numa posição de cidadão e cidadã, pessoas que construiram este país e este Estado”, enfatizou o secretário.

Grande presença da sociedade civil no evento
Pelo projeto de lei apresentado para o povo de Santa Inês, o governo do Estado criará uma reserva aos negros de 30% (trinta por cento) das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública estadual, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pelo Estado do Maranhão. Prevê ainda que somente poderão concorrer às vagas reservadas pelas cotas os candidatos negros que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público e que os candidatos que não façam esta autodeclaração ficarão submetidos às regras gerais estabelecidas no edital do concurso.

Quanto ao percentual de trinta por cento expresso no projeto de lei o secretário explicou que “o Brasil tem 50,7% de negros na sua população, segundo o IBGE 2010 e no Maranhão, o percentual de negros na população é de76,2%, ou seja, mais de três terços da população é de pretos e pardos; logo achamos justo que o percentual seja maior”
Este mesmo tema foi debatido com a sociedade dos municípios de Imperatriz, Bacabal e Codó e, segundo o secretário Gerson, continuará nas grandes cidades do Maranhão, culminando com a realização ainda este ano da audiência pública na capital São Luis.

Fonte: SECOM do Governo Estadual