Texto de Thayz Athayde*
Judith Butler em seu livro Gender Trouble (Problemas de Gênero, na tradução para o Brasil), lança uma pergunta para o feminismo: afinal, de que mulheres estamos falando? Conseguimos falar de todas as mulheres? Todas as mulheres estão falando? Quem são as mulheres que são sujeitos do feminismo?
Ora, a pergunta não é simples. Talvez não tenha resposta ou não saibamos responder, ou ainda, não queiramos responder. A importância dessa pergunta diz respeito a que feminismo estamos fazendo. Já que não existe um feminismo, mas vários, podemos nos perguntar qual feminismo estamos fazendo, para quem e com quem. Em outras palavras, o feminismo que fazemos é feito para quais mulheres? Quem está do nosso lado fazendo política para mulheres?
E amanhã é o dia das mulheres. Dia esse em que muitas mulheres recebem rosas e parabéns por serem mulheres. Por serem A mulher. Por representarem o papel de mulher que nos esforçamos para ser, mas que jamais seremos. E parafraseando Butler, pergunto de quais mulheres falamos no dia das mulheres. Não estou falando de promoções de farmácia, rosas ou qualquer coisa parecida. Já deixamos claro aqui que 8 de março é um dia de luta.
Afinal, qual imagem de mulher passa pela sua cabeça quando pensamos no sujeito mulher? Para os padrões normativos do que é ser mulher, existe apenas uma imagem: branca, hétero, cis, sem deficiência, magra, classe média ou rica, que mora na cidade, faz faculdade. Provavelmente não vou conseguir colocar tudo o que representa essa imagem dA mulher. São as pegadinhas da identidade.
E como uma mulher deve ser? Doce, inteligente (mas, nem tanto), livre (mas, nem tanto), descolada, romântica, simpática e a cereja do bolo: se dar o respeito. As mulheres de capa de revista não existem. Essa imagem da mulher não existe. Existe sim uma pluralidade de identidades. Não existe uma identidade única de Mulher. Mas, várias identidades que acompanham uma delas que é mulher. Eu, enquanto mulher branca e cis, sofro com machismo.
Uma mulher negra sofrerá com o machismo e racismo. Uma mulher trans* com machismo, transfobia e cissexismo. Ora, não há um vetor único de opressão. Audre Lorde diz melhor:
“Dentro da comunidade lésbica eu sou Negra, e dentro da comunidade Negra eu sou lésbica. Qualquer ataque contra pessoas Negras é uma questão lésbica e gay, porque eu e milhares de outras mulheres Negras somos parte da comunidade lésbica. Qualquer ataque contra lésbicas e gays é uma questão sobre direitos dos negros, porque milhares de lésbicas são Negras e milhares de homens gays são Negros. Não existe uma hierarquia de opressão.”
Por isso, hoje quero tentar falar de todas as mulheres. Tentar falar de todas as mulheres não significa falar pelas mulheres. É muito mais uma tentativa de não pensar em uma identidade universalizante de mulher. Mas, falar por todas elas? Jamais. Aliás, nem dá pra falar por todas elas. O objetivo é falar dessas mulheres que para muitas pessoas não existem e que fazem da vida sua própria existência e resistência.
Quero falar das mulheres negras, das indígenas, das mulheres que não são brancas. Das mulheres com pênis, de seios siliconados, das que não tem seios, dos seios pequenos, dos seios grandes, dos seios. Das mulheres que não tem vagina, não tem útero, não tem ovário, por diversos motivos e não apenas por um único. Das mulheres lésbicas e das bissexuais. Das mulheres que se relacionam com outras mulheres, que amam outras mulheres, que se apaixonam por outras mulheres. Daquelas que gostam de homens e de mulheres, não porque estão confusas, mas porque gostam. Das mulheres prostitutas, daquelas que gostam de ser prostitutas e daquelas que estão ali por outros motivos que não cabe julgamento algum. Das mulheres que moram no campo, no sertão, fora da cidade. Das mulheres pobres, das marginalizadas, daquelas que fingimos não ver.
E mesmo tentando falar de todas as mulheres, sempre esquecerei de uma ou de todas. Nesse dia das mulheres eu desejo luta, resistência e existência à todas as mulheres e suas identidades que atravessam o ser mulher.
*Thayz Athayde - A Rainha da Copacabana Feminista. Delicada e nervosinha. Mas, eu posso, sou a Vossa Majestade.
Fonte: Blogueiras Feministas
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